Dragon Ball na Mídia - Febre oriental

Jornal Folha de São Paulo, 20/10/02 - TV Folha
Febre Oriental

Mais três desenhos animados japoneses estréiam na TV paga para alegria dos fãs. Mas qual o segredo de tanto sucesso?
Marcelo Migliaccio

Para que se tenha uma idéia da penetração dos desenhos animados japoneses no planeta, a expressão "Dragon Ball" foi a mais procurada no site de busca Lycos no ano passado, deixando para trás Britney Spears, Napster, Osama bin Laden e World Trade Center. Neste mês, os fãs brasileiros do gênero foram presenteados com mais três estréias, todas no canal pago Fox Kids, que já está exibindo "Beyblade" (18h), "Shaman King" (19h) e "Medabots" (22h), no bloco "Invasão Anime". Mas qual a razão de tanta popularidade? "Diferentemente do desenho tradicional, nos "animes" [abreviação de "animations'" todos os episódios são amarrados, como uma novelinha. Os personagens são desenvolvidos a fundo. Esse elo que o telespectador cria com a história pode ser uma explicação", diz Flávio Rocha, diretor responsável pela programação infantil da Globo. A emissora exibe atualmente a terceira temporada de "Digimon Tamers" e "Dragon Ball" na faixa "TV Globinho", e "Dragon Ball Z" na "Sessão de Desenhos". "Em alguns poucos casos, torna-se necessário suavizar o conteúdo de alguma cena para adequá-lo à faixa etária do programa", diz Rocha. "Os "animes" têm forte conteúdo moral e dão uma clara distinção entre o bem e o mal", afirma Herbert Greco, diretor responsável pela programação do Fox Kids. Para Cindy Kerr, vice-presidente de programação e aquisições do Cartoon, "sendo você jovem ou velho, um roteiro é capaz de conquistar a sua fidelidade." A direção ágil, a animação limitada (12 quadros por segundo contra 24 dos desenhos clássicos) e as cores contrastantes também contribuem para o interesse despertado por essas produções, segundo Cristiane Sato, presidente da Abrademi (Associação Brasileira de Desenhistas de Mangá e Ilustrações). "Comecei a ver "animes" aos 10 anos. Olhamos nos olhos dos personagens e vemos as emoções. Alguns deles crescem com os telespectadores, como acontece em "Dragon Ball'", diz Lilian Maruyama, 23, ativista da Orcad (Organização Cultural de Animação e Desenho), que reúne fãs em São Paulo.

Violência
Mas há os que enxergam uma dose excessiva de violência nos "animes", assim como ocorre nos desenhos americanos, nos quais levar uma bigorna na cabeça é rotina. Para Maria Angela Barbato Carneiro, professora da Faculdade de Educação da PUC-SP, o desenho japonês violento pode estimular a agressividade nas crianças. "O mundo da criança está perdendo o encanto", afirma. O diretor de programação do SBT, Mauro Lissoni, concorda: "Em função do teor agressivo desses desenhos, e em respeito ao público, resolvemos não incluir tais produções em nossa grade de programação". "Temos cautela, equipes do Fox Kids e da Disney [proprietária do canal" avaliam e cortam cenas agressivas", diz Flávio Medeiros, diretor do grupo Disney. Claudemir Edson Viana, pesquisador do Lapic (Laboratório de Pesquisa sobre Criança, Imaginário e Televisão), concorda que o desenho é capaz de influenciar crianças com problemas emocionais cuja separação de fantasia e realidade não esteja clara. "Mas a maior influência vem do meio em que a criança vive. Por isso, o papel dos pais na formação moral e social é fundamental", diz. Viana, porém, afirma que a violência dos desenhos japoneses não é gratuita, mas parte do desafio do personagem dentro de um contexto narrativo. Ele considera os "animes" mais sutis que as produções dos EUA, onde as lutas envolvem quase sempre disputas individuais por bens materiais. "Não há oposição tão estereotipada e mecânica. Jovens lutam pelo bem da humanidade."

Público alvo
Aí entra outra questão: muitos desenhos japoneses consumidos no Brasil por crianças não foram concebidos para o público infantil. "Os "animes" exibidos aqui geralmente são os lançados para adolescentes ou adultos no Japão", diz Cristiane Sato, que, no entanto, considera noticiários e "talk shows" mais nocivos às crianças.