O que se segue é um compilado de entrevistas recentes com Kazuhiko Torishima, de 2015 a 2019, mas vale lembrar que já existem traduções de outras conversas dele aqui no site, seja com outras pessoas ou com Akira Toriyama, nestes links abaixo:
Mechanko Talk – Parte 1 (1993)
Daizenshuu 2 – Diário de Shenlong (1995)
Técnicas Definitivas de Mangá do Dr. Mashirito (2023)
Estação de Transmissão Secreta de Yubo & Mashirito (2024)
Entrevista com Kazuhiko Torishima no canal oficial da editora francesa Kazé (03 de janeiro de 2015)
Kazé é uma editora francesa especializada em anime e mangá. Sua sede fica no 9º arrondissement de Paris. Fundada em 1994, a empresa estreou publicando Chronicles of Lodoss War em VHS.
SEU ENCONTRO COM AKIRA TORIYAMA
Eu tinha 25 anos e todo mês a revista Jump recebia trabalhos de jovens artistas de mangás. Que ainda é como ela funciona. Cada mês, um de nós tinha que escolher um jovem autor e acolhê-lo, para fazê-lo evoluir.
Toriyama se candidatou durante o mês que era minha vez de escolher. Recebíamos entre 100 e 150 candidatos todos os meses. Eu era o empregado mais jovem naquela época. Eu li todos os trabalhos que recebemos naquele mês, e o dele foi o que chamou minha atenção.
Os empregados mais experientes escolheram autores que eles tinham mais confiança, mas eu permaneci com minha escolha. A razão pela qual escolhi o Toriyama foi por quão polido seu trabalho parecia. Os jovens autores costumavam corrigir excessivamente seus desenhos com uma caneta corretiva. Contudo, os desenhos do Toriyama não mostravam nenhum traço de terem sido corrigidos. Eles eram muito limpos!
Além disso, suas folhas de desenho eram muito únicas. Me refiro aos efeitos sonoros. Ou como também são conhecidos: Onomatopeia. Elas normalmente são feitas em japonês, mas no caso do Toriyama, todas as suas onomatopeias eram em alfabeto romano, e não em katakana. Na época, isso era inovador. E era visualmente lindo. Foi isso que me impressionou.
Então eu disse à equipe editorial sobre minha escolha de ficar a cargo dele. Paradoxalmente, o conteúdo era divertido, a arte era linda, mas seu trabalho não recebia reconhecimento. Na verdade, era uma paródia de Star Wars, que não poderíamos imprimir sem ter os direitos.
Então, os leitores não podiam votar nele. Embora, estamos falando do autor de Dragon Ball, mas ele nenhuma vez recebeu qualquer prêmio por seus trabalhos. No Japão, o chamamos de “Imperador sem Coroa”.
E foi assim que me tornei seu editor!
Primeiramente, mandei um telegrama para Nagoya. “Você tem talento. Me ligue o mais rápido possível.” Assinado: Torishima.
Foi assim que meu relacionamento com Toriyama começou.
PARA SE TORNAR UM ARTISTA DE MANGÁ
Por que ele queria se tornar um artista de mangá? Porque tinha problemas para levantar cedo e estava sempre atrasado para o trabalho. Toriyama estava trabalhando para uma agência de design em Kyoto. Ele estava encarregado de criar layouts, designs e ilustrações, e, aparentemente, tinha talento no que fazia. Mas nunca foi promovido porque se atrasava frequentemente. Isso o irritou e ele deixou a empresa.
Então, seus familiares lhe disseram para começar a procurar emprego, e ele não sabia o que fazer. Tudo que ele conseguia fazer era desenhar. Ele podia escolher entre se tornar um ilustrador ou um artista de mangá. Toriyama vivia no interior e não sabia o que fazer para se tornar um ilustrador.
Há muito tempo, Nagoya tem sido uma cidade com muitas cafeterias. Seus pais lhe davam 500 ienes por dia. Apenas comprar cigarros e ir às cafeterias lhe custava todo o dinheiro que tinha. Ele passava seu dias desperdiçando tempo em cafeterias, até que um dia abriu um folheto contendo ofertas de emprego e encontrou uma propaganda de um concurso de mangá.
Ele então pensou que esta era a chance de se tornar um artista de mangá. O interessante é que mangás focados em história precisavam ter 31 páginas, enquanto os mangás de comédia precisavam de apenas 15. Essa regra de ouro é válida até hoje. Mas o prêmio dado ao vencedor é o mesmo! Ele escolheu fazer mangás de comédia porque conseguiria o mesmo pagamento por metade do trabalho.
Então ele começou a desenhar as 15 páginas e voltou à cafeteria para verificar a revista. Foi então que teve a maior de todos as surpresas! Ele enviou após o prazo de entrega, portanto, não poderia mais participar.
Mas tinha uma revista Shonen Jump logo ao lado dele, que aceitava candidatos todos os meses. Então, o que ele fez foi enviar os manuscritos que deveria ter enviado para a outra revista, para a Shonen Jump. Eu vi aqueles manuscritos que ele enviou e foi assim que nos conhecemos. Se ele tivesse enviado para a outra revista mais cedo, quem sabe onde qualquer um de nós estaria hoje.
Infelizmente, aqueles manuscritos nunca forma populares com os leitores. Conseguimos quase nenhum feedback positivo. Foi assim que nossos tempos difíceis começaram. O que um amador precisa para conseguir ter uma série publicada? Normalmente, os artistas tem seus trabalhos publicados em livretos bônus, e só então em uma revista para jovens artistas. Quando os diretores de uma editora começam a tomar conhecimento sobre o nome de um artista, o fazem desenhar storyboards para serialização e, se for aprovado, seu trabalho é publicado na revista.
Esse é o caminho normal para se ter um trabalho publicado!
Então… Toriyama fez alguns one-shots, mas eles não foram populares. Por quê? Ele nunca realmente tinha feito qualquer mangá antes daqueles manuscritos que eu selecionei! Ele foi inspirado a desenhar mangá, sem entender como fazer isso. E eu só tinha 3 anos de experiência. Eu não sabia como fazer mangás, muito menos como fazê-los serem bons.
Ao longo dos anos, analisei profundamente, como um editor, a arte dos mangás. Em essência, como os quadros são recortados. Se um autor for ensinado a como se deve fazer, a qualidade instantaneamente sobe de nível. O layout é algo característico dos mangás. Como a página deve ser montada? Como se quer mostrar o trabalho? O importante é que tudo acontece através do movimento. É o dinamismo que caracteriza o mangá. Foi Osamu Tezuka quem descobriu isso. Atualmente, ainda existem pouquíssimos editores que sabem o que fazer para obter esse dinamismo.
Então, estudei extremamente sobre esse aspecto e ensinei ao Toriyama.
Ele rapidamente absorveu meu ensino e seu trabalho rapidamente melhorou. No fim, levou cerca de 2 anos para seu nome se tornar suficientemente conhecido e ele finalmente conseguir ter uma série publicada. E aqueles 2 anos foi o tempo que ele se deu. Ele tinha prometido aos seus pais que desistiria de tentar se tornar um autor de mangá, se não conseguisse fazer isso em 2 anos.
DR. SLUMP
Depois de ler o primeiro capítulo de Dr. Slump, eu sabia que poderia se tornar algo. Então, aprendi uma coisa surpreendente. Toriyama queria que Senbei Norimaki, o “Dr. Slump” do título, fosse o personagem principal, e Arale seria apenas outra de suas invenções, que estaria apenas no primeiro capítulo. Não era pra ela reaparecer.
Contudo, Arale Norimaki era realmente carismática. Eu notei que um monte de personagens de fundo, como as abelhas, estavam todos vestidos como meninas e eram bastante fofas. Percebi isso e propus a ele que fizesse o protagonista ser a garotinha. Mas Toriyama não queria fazer isso, porque deveria ser um “shonen manga”, voltado para garotos.
Então, lhe sugeri uma coisa. Pedi a ele para desenhar um One-Shot apresentando uma protagonista feminina, e publicaríamos numa edição especial da revista. Se fosse bem recebido, faríamos Arale ser a personagem principal. Se não fosse, Toriyama poderia fazê-la desaparecer.
Fizemos como eu sugeri e, assim como previ, o mangá tornou-se muito bem sucedido. Ganhei nossa aposta. Contudo, ele ainda manteve o título “Dr. Slump”. Foi assim que essa obra começou.
O título rapidamente se distinguiu dos outros jovens artistas, se tornando o sucesso que conhecemos. E graças ao dinheiro que Toriyama fez com Dr. Slump, ele pode se dar ao luxo de se mudar. Mergulhando em seus arquivos, Toriyama encontrou cerca de 500 manuscritos que eu recusei, desde que ele tinha começado.
Dr. Slump só foi feito por causa de todas as nossas constantes tentativas e erros com aqueles 500 manuscritos anteriores. O mais incrível sobre o Toriyama era que ele reusava algumas piadas dos projetos recusados, em Dr. Slump, sem eu saber. Fiquei sabendo disso depois. E essa é a história de como Dr. Slump surgiu.
O NASCIMENTO DE DRAGON BALL
Dr. Slump começou e se tornou um sucesso, claro, mas depois de cerca de meio ano, Toriyama queria terminar a série. A razão pra isso foi que Dr. Slump era uma série episódica, e era – e ainda é – difícil de inventar novas histórias para cada capítulo.
Além disso, eu frequentemente pedia ao Toriyama para trabalhar com as piadas que eu achava chatas. Já que era uma obra de comédia com apenas 15 páginas, significava que se eu pedisse para refazer algo, ele teria que refazer todo o capítulo. Com isso acontecendo frequentemente para uma série semanal, se tornou muito desgastante para ele.
Ser uma publicação semanal significa que ele teria apenas 7 dias para terminar tudo. 3 ou 4 dias eram necessários para o roteiro, 2 dias para o desenho, e conseguiria ter 1 dia extra se estivesse com sorte. Ao longo de 6 meses, isso se tornou um ritmo muito trabalhoso para ele, e por isso ele queria parar com Dr. Slump.
Mas a série tinha muito sucesso. Tínhamos até mesmo uma oferta para torná-la em uma adaptação de anime para TV. Fora que tinha se tornado o mangá número 1 da Shonen Jump. Estava vendendo 2 milhões de cópias nas primeiras impressões. Não podíamos parar. Conversei sobre isso com o Editor Chefe e ele aceitou parar, se viéssemos com algo ainda mais interessante que Dr. Slump. Isso era quase impossível.
Entretanto, Toriyama queria parar, então tínhamos que iniciar em outro caminho. O único jeito era finalizar os capítulos de Dr. Slump em 5 dias, em vez de 7, e usar esses 2 dias em One-Shots com potencial para se tornarem novos projetos. Durante este período, Toriyama se tornou bem popular como artista, e eu me tornei mais confiante como um editor.
Então, pensei que rapidamente encontraríamos outra história sem muitos problemas. Mas ao contrário das minhas expectativas, nenhum dos One-Shots gerou interesse nos leitores, e estávamos nos cansando disso depois de um tempo. Agora, estávamos sempre nos comunicando por telefone, já que eu estava em Tóquio e ele em Nagoya.
Não sabíamos o que fazer, então decidimos nos encontrar cara a cara em Nagoya. Falamos sobre o que fazer, mas ainda não tínhamos conseguido nenhuma boa ideia. Eu estava prestes a voltar à Tóquio de mãos vazias, quando a esposa de Toriyama nos trouxe chá. Sua esposa também era uma artista de mangá. Ela disse a frase que ficou em minha cabeça. O que ela disse foi que achava seu marido um artista de mangá atípico.
Um artista de mangá normalmente ouve rádio ou música enquanto está preenchendo com tinta, porque lhe faz relaxar enquanto se concentra em suas mãos. Isso é muito comum. Mas Toriyama deixava vídeos rodando enquanto estava trabalhando. O que quero dizer com isso é que ele deixava filmes rodando em vídeo, enquanto trabalhava.
Isso não deveria ser possível, certo? Como alguém pode desenhar enquanto assiste um filme? Mas ela disse que, sim, ele conseguia. Eu perguntei a ele o porquê disso, e ele disse: “Bem, tem esse filme que eu gosto… eu apenas ouço os diálogos, e eu sei quando as melhores cenas do filme começam.” Então ele parava pra assistir.
Eu lhe perguntei sobre o que era aquele filme. Ele me disse que era um filme de kung-fu de Jackie Chan. Então, perguntei quantas vezes ele já tinha visto, e ele respondeu: “entre 50 e 100 vezes!”
Se ele gostava tanto assim, lhe perguntei, por que não fazer um mangá sobre isso? Foi quando ele desenhou Dragon Boy, o antecessor de Dragon Ball. Teve apenas 13 páginas, mas a recepção foi incrível! Isso foi a base para Dragon Ball.
Já que Dragon Boy deu certo, por fim, Toriyama começou a desenhar os storyboards para a nova série, Dragon Ball. Ele finalmente tinha a oportunidade de parar com Dr. Slump. A série durou, portanto, 2 anos e 8 meses. E então, a serialização de Dragon Ball começou.
Houve uma pausa de 3 meses entre a serialização das duas obras, mas Toriyama apenas tinha duas semanas livres, antes de Dragon Ball começar. Durante estas duas semanas, tivemos que preparar as próximas séries. Isso foi muito trabalhoso, e ele admitiu me amaldiçoar por isso. E então, tínhamos começado a publicar Dragon Ball, mas não obteve o sucesso esperado desde o início.
Neste ritmo, a serialização estava definida para acabar. A obra estava realmente com problemas e, depois de analisar, o problema se resumia a uma coisa: o personagem do Goku não deixava uma forte impressão nas crianças. Então nos sentamos e pensamento sobre como fazer o Goku ser mais carismático com as crianças. Tivemos que reiniciar tudo.
Para fazer isso, pedi ao Toriyama para se livrar de todos os personagens, exceto Mestre Kame, e colocamos penso em que tipo de personagem o Goku deveria ser. Basicamente, ele quer se tornar forte. Ele vive apenas por isso. Esta é sua única vontade e desejo que o mantém seguindo em frente. Descobrimos que faríamos disso o ponto central de seu personagem. Então, precisávamos de um personagem mesquinho e travesso, para contrastar com Goku e tornar sua caracterização mais clara. Foi aí que Kuririn apareceu.
Quando Goku e Kuririn começaram seus treinos com Mestre Kame, a série obteve as melhores avaliações imediatamente. Tínhamos planejado um treino curto, que os conduziria ao Torneio de Artes Marciais, para mostrar a evolução de Goku através dos combates. Os japoneses amam torneios, especialmente os famosos torneios de beisebol “Koshien”. Eles gostam de ter esse sistema simples de mostrar quem está ganhando e quem ainda está no jogo.
E este foi o modelo para o Torneio de Artes Marciais. E então, a popularidade da série disparou e Dragon Ball acabou se tornando um sucesso. Naquela época, o carro-chefe da Shonen Jump era Hokuto no Ken. Eu estava muito interessado nele. Hokuto no Ken é baseado nos filmes de Bruce Lee. Nesta série, você tinha o personagem principal dando um soco e, então, eles mostravam quão forte o soco era através da reação do oponente.
Claro, imitar isso cegamente não funcionaria. Dragon Ball é inspirado nos filmes de Jackie Chan, então estudamos suas cenas de ação para ver como a velocidade é ilustrada e incorporamos isso na série para mostrar como o Goku derrotava seus inimigos.
O resultado excedeu nossas expectativas e Dragon Ball superou Hokuto no Ken, se tornando o mangá número 1 mais rápido do que prevíamos.
A MENSAGEM DE DRAGON BALL
Como eu disse, Goku quer se tornar forte. Essa é a mensagem de Dragon Ball. É disso que se trata o nosso herói. Então, o que significa querer ser mais forte? É o sentimento de querer se superar, indo ainda mais longe, não é? Mas como todos vocês podem ver ao assistir Dragon Ball, Goku estará interessado em lutar contra oponentes fortes, para que ele possa crescer em poder, mas não importa quão vil possam ser, ele não os elimina!
Ele não mata ninguém. E isso porque ele ama oponentes poderosos! Isso é o que é estranhamente atraente em Goku, não é? Ele é um personagem cheio de compaixão humana. E eu acho que essa é a mensagem de Dragon Ball.
Quando eu entendi que a série seria um sucesso? Como disse antes, entendi isso quando Dragon Ball superou Hokuto no Ken em vendas de mangá. Contudo, o momento em que eu realmente acreditei que a série seria um sucesso, foi quando o personagem Piccolo apareceu e Goku o enfrentou. Foi aí que eu realmente comecei a acreditar que Dragon Ball seria algo incrível.
Por que digo isso? Bem, até então, todos os inimigos criados por Toriyama, sejam maldosos ou apenas outros oponentes que Goku derrotou, eram todos inspirados em Dr. Slump. Eles não davam nenhuma impressão clara de serem maus ou cruéis, não concorda? Eu ficava no telefone com o Toriyama todo dia. Um dia, começamos a discutir sobre como seria um inimigo realmente mau.
Durante nossa conversa, eu expliquei a ele o que faz esta ou aquela pessoa histórica ser classificada como má. Então, durante nossa sétima discussão sobre este assunto, concordamos sobre Nero, o romano conhecido como “Imperador Insano”. Ele foi alguém bastante sádico, que sentia prazer quando as pessoas sofriam ou gritavam. Hoje, ele seria classificado como um psicopata. Esse é o tipo de pessoa que ele foi.
A ideia cresceu em Toriyama quando ele entendeu que os maldosos gostam de ver os outros sofrerem. E, assim, ele criou o personagem de Piccolo, alguém que Goku ia enfrentar. Ele foi capaz de desenhar um personagem verdadeiramente mau. Alguém que fosse “sombrio”, para ressaltar a “bondade” de Goku. Ele tinha dado outro passo como autor, confirmando que ele poderia escrever um drama genuíno.
Foi quando pensei que Dragon Ball poderia continuar por mais 5 ou 10 anos.
A INFLUÊNCIA DE DRAGON BALL
Uma das maiores particularidades de Toriyama como um artista de mangás era que ele nunca tinha lido muito mangá. Ele era um artista sem qualquer interesse em outros mangás. Mesmo eu, antes de começar a trabalhar numa editora, não sabia muito sobre a Shonen Jump, e nunca tinha lido qualquer mangá.
O que poderia acontecer quando um editor que nunca leu um mangá e um artista que não tem interesse nisso, se encontram? Bem, o que você tem é um mangá não vinculado às normas existentes. A vantagem é, acima de tudo, que eles irão criar um mangá livremente.
E então, a esse respeito, o mangá de Toriyama oferecia algo completamente novo. Em uma palavra, ele poderia ser considerado um mestre em tomar atalhos. Por exemplo, aqueles que conhecem Dragon Ball devem se lembrar das estátuas ao fundo do Torneio de Artes Marciais. Ele costumava ir a Bali, e aquelas estátuas eram feitas para lembrar as estátuas que ele tinha visto lá. No começo, ele as desenhou por si mesmo, mas, depois, o assistia as fazia.
Um dia, quando o manuscrito atrasou, um assistente reclamou sobre ter que desenhá-las toda semana. Então, Toriyama disse: “Oh, já sei, vamos fazê-las serem destruídas!” Então ele fez Goku destruí-las durante o Torneio de Artes Marciais, para que eles não precisassem mais desenhá-las. Este é apenas um exemplo. Outro é a transformação Super Saiyajin de Goku.
Toriyama fazia marcações em X apontando onde deveria ser pintado de preto, e um assistente cuidava de preencher esses pontos com tinta. Um assistente ocupado novamente reclamou sobre ter que preencher de tinta o cabelo espetado de Goku a todo momento. Então, Toriyama disse: “Oh, já sei, vamos fazê-lo se tornar um Super Saiyajin!” “Seu cabelo vai ficar branco, então não haverá o que preencher!”
Foi sua ignorância sobre como fazer um mangá que o fez ter essas ideias e executá-las livremente. E isso teve um papel importante em sua forma de trabalhar. Depois, houve outra coisa que me surpreendeu bastante. A popularidade de um mangá é extremamente dependente da impressão que o protagonista deixa nos leitores. Eu falei sobre isso mais cedo. Por exemplo, Dragon Ball não teve o sucesso esperado no começo e nós quebramos a cabeça tentando aperfeiçoar o Goku.
De repente, Toriyama queria fazer Goku crescer e tornar suas proporções mais realistas. No começo do mangá, o Goku criança tem uma cabeça grande que ocupa 1/3 de sua altura. Toriyama queria mudar suas proporções para 1/8. Eu me opus fortemente a essa ideia, porque isso mudaria o personagem, e isso ia contra as regras do mangá.
Ele insistiu em fazer isso, e me deu um ultimato sobre parar a série se não pudesse fazer isso. Então eu pedi a ele para se explicar, e o que ele disse para me fazer entender foi… Seguindo a aparição de Piccolo, as lutas em Dragon Ball tinham se tornado muito mais tensas. Para mostrar isso, Toriyama precisava consultar gráficos anatômicos e desenhar os músculos se movendo de forma mais detalhada.
Como quando eles tencionam para expandir suas auras, e você consegue ver seus músculos inchando. Ele tinha que usar os músculos dos personagens para expressar tal atmosfera tensa. Mas ele não poderia desenhar músculos apropriadamente com a cabeça ocupando 1/3 da altura do personagem. Desenhando-o com uma proporção corpo-cabeça de 7:1, a apresentação das lutas se tornaria mais realista.
E quando ele me disse isso, pensei: “Oh, claro, isso faz sentido”. Mas isso era um grande risco pra mim como editor. Se o desenho do personagem principal mudar, a impressão dos leitores mudará também. Quando eles pensarem que a série já não é mais a mesma, a popularidade vai subitamente cair.
Então, na próxima Segunda, o dia em que a Shonen Jump saiu à venda, eu me sentei e fiquei esperando o tempo todo em meu escritório, até às 15h. Por que até às 15h? Bem, porque é quando as crianças voltam pra casa da escola e leem a Jump. Sempre recebemos ligações por volta das 15h, se elas possuem reclamações.
Contudo, o telefone tocou apenas uma vez naquele dia e não era a ligação de uma criança! Era um fã adulto que disse que o Goku estava realmente mal desenhado naquela semana, e ele se perguntava se era um assistente que o tinha desenhado. “Não, não é por isso… A razão disso é que é a primeira vez de Toriyama desenhando o Goku mais realisticamente”, eu disse. Mas não recebemos uma única reclamação das crianças! A popularidade apenas se tornou maior!
Foi assim que aconteceu. Isso é o que é tão interessante sobre o Toriyama. Ele não pensa sobre a melhor forma de compartilhar ideias, que ele acha interessantes, com os leitores. Em vez disso, ele diretamente coloca o que acha interessante. Nenhum outro artista de mangá tinha feito aquilo antes dele.
Geralmente, todos pensam intensamente, enquanto desenham, sobre como agradar seu público. Ele era bastante desleixado, mas de uma forma boa. Ele realmente só desenha o que sente vontade de desenhar. No fim das contas, ele não tem interesse depois que termina de desenhar. Simplesmente deixava seus manuscritos espalhados e bagunçados.
Eu ficava realmente nervoso quando íamos lançar um artbook dos trabalhos de Toriyama. Eu perguntei a ele sobre os esboços dos personagens de Dragon Ball, para publicar, e ele disse: “Hm, os livros de esboços devem estar em algum lugar por ali.” Quando eu os encontrei, fiquei surpreso ao ver que os esboços de Toriyama estavam cobertos com rabiscos de crianças!
Para ele, eram tão sem importância que ele os daria a seus filhos para que tivessem algo em que desenhar! Corri para pegar os cadernos de esboços que ainda estavam intactos! Então, como pode perceber, ele era uma figura realmente atípica. Ele era realmente misterioso.
Bem, em relação ao lado comercial das coisas, precisa ser dito que a Bandai teve dificuldades em aumentar as vendas. Já que eles sempre nos ajudaram em Dragon Ball, eu não queria vê-los com problemas financeiros, e pensei sobre o que poderia ser feito por eles. Nosso contato com a Bandai na época me pediu se seria possível fazer uma nova animação de TV de Dragon Ball, mas Toriyama recusou fazer uma nova história de Dragon Ball.
Discutimos com a Bandai sobre o que fazer, e vimos o óbvio. O que eu quero dizer? Bem, Dragon Ball foi um tremendo sucesso e, na época em que a primeira transmissão de TV começou, o anime alcançou o mangá. Mas a transmissão de TV não podia estar à frente do mangá, portanto, eles tiveram que estender uma cena de uma ou duas páginas do mangá, para até 30 minutos de animação, a fim de manter o anime em andamento.
Isso significa que, em 1 episódio de 30 minutos, apenas 5 ou 10 minutos eram do mangá e o resto era feito para a TV. Então, a série original de TV estava lotada de cenas que não existiam no mangá. Eu vi as produções de TV várias vezes e, enquanto reassistia na época em que os DVD’s estavam saindo, notei que eles adicionaram cenas que atrapalharam o ritmo. Naquela época eu pensei comigo mesmo: “Hey, e se nós cortarmos essas cenas adicionais?” “Como seria se a série de TV fosse editada para ser completamente fiel ao mangá?”
Quando tentamos isso, o ritmo ficou muito melhor! Além do mais, removemos a sujeira dos filmes e remasterizamos tudo. A imagem estava bastante limpa, mesmo se não fosse tão boa quanto as da televisão moderna, e o som estava como nunca antes. O que quero dizer é, as vozes dos atores de voz estavam muito mais claras, e elas estavam em faixas diferentes, separadas das músicas de fundo. Então, seguimos como isso e a recepção foi bastante positiva. E ao mesmo tempo, a Bandai lançou um jogo de cartas que foi um grande sucesso, então tudo ia bem. Essa é a origem de Dragon Ball Kai, e esse foi o seu planejamento.
SEU PERSONAGEM E EPISÓDIO FAVORITOS
Meu personagem favorito de Dragon Ball… bem, na verdade é o Piccolo, aquele que eu, aparentemente, servi como modelo. A resposta oficial é que é o jovem Piccolo, que veio depois, mas, sinceramente, não é o que eu realmente penso. Eu gosto, de fato, do Piccolo maligno que veio primeiro.
Toriyama mesmo disse que eu fui a inspiração para ele. É claro que, assim como foi com o Mashirito em Dr. Slump, sem um modelo concreto e real, o personagem fica sem graça e não tem alma. Então, como eu disse antes, Piccolo tinha que ser um oponente terrível que Goku genuinamente gostaria de lutar em seu primeiro encontro, e acho que ele me imaginou quando criou esse personagem.
Então, embora eu odeie admitir, esse foi o momento em que Dragon Ball realmente se tornou algo excepcional. Então, meu personagem favorito… falando como um editor, tem que ser o Piccolo.
É, na verdade, um episódio que causou grande confusão no exterior, porque, conforme Goku lutava, seu uniforme rasgou e ele ficou nu. Então ele se levantou, com seu pênis pra fora, e percebeu que algo estava estranho. Foi então que ele percebeu que era porque estava pelado. Só o Toriyama poderia ter uma ideia como essa. Estamos vendo um Goku puro e ingênuo.
O que quero dizer é que, naquela cena, Goku retorna a como ele estava quando nasceu. Então ele começa de novo do zero. E, a partir daí, ele está prestes a ficar mais forte. É por isso que é uma cena e episódio importantes. Mas, no exterior, nudez é um grande tabu em desenhos para crianças, então eles o cobriram com uma cueca. Eu achei isso tão frustrante!
Costumo repetir isso, mas direi novamente. Para crianças, seja no Japão, França ou em qualquer outro lugar, o episódio está bem como está. Apenas os adultos têm problemas com isso. É por isso que digo a todos que apenas viram a versão em que Goku está de cueca, para darem uma olhada na versão japonesa e verem a cena onde Goku está nu. Por favor, façam isso!
Certo, isso é tudo!
Entrevista com Kazuhiko Torishima no site Livedoor News (03 de junho de 2015)
Obs: A versão apresentada aqui é um resumo feito pelo site Kotaku, devido ao artigo original da Livedoor News ter sido retirado do ar!
“Dragon Ball deveria ter terminado com o arco de Freeza”, afirma o ex-editor de DB
Por Brian Ashcraft
Dragon Ball não terminou. Estamos recebendo uma nova série e, sem dúvida, mais filmes. Mas o ex-editor do mangá de DB, Kazuhiko Torishima, acha que tudo deveria ter terminado há muito tempo.
Durante a década de 1980, na revista Weekly Jump, Torishima trabalhou em estreita colaboração com o criador de Dragon Ball, Akira Toriyama, editando seu mangá Dr. Slump. Ele também foi o primeiro editor a trabalhar em Dragon Ball. Mas em 1993, ele foi o editor-chefe da então recém-lançada V-Jump. Agora, ele é o chefe da Shueisha, a editora que publica a Weekly Jump e uma série de revistas. Ele é um cara importante!
Em uma entrevista recente relatada no Livedoor News, o comediante Kendo Kobayashi mencionou o quão icônico Dragon Ball se tornou no Japão e perguntou a Torishima, agora que ele se afastou da série, suas impressões.
“Sim… eu me pergunto onde é um bom lugar para terminar isso,” Torishima respondeu.
Kobayashi concordou que fazer um final não seria fácil e perguntou a Torishima onde ele achava que seria o melhor lugar para terminar.
“Claro, deveria ter sido encerrado com a Saga Freeza.”
Acredito que Torishima acha que foi um final lógico? Ou talvez ele não tenha ficado entusiasmado com o que se seguiu. Referindo-se ao Dr. Gero e aos Androides 17 e 18, Torishima disse: “Se você vai fazer um velhote brigar com mulheres, então é melhor encerrar”.
Mas, como explica o Livedoor News, Dragon Ball se tornou muito popular. Havia muitas pessoas envolvidas e muito dinheiro em jogo. Não teria sido fácil terminar.
Naquela época, Torishima disse que não era mais editor de Toriyama e estava em outra revista (V-Jump). Com o que estava acontecendo com o anime, as coisas aparentemente estavam difíceis para Toriyama. “Foi o momento mais difícil e não fui capaz de ajudá-lo”, disse Torishima.
“Isso é apenas um ‘e se’, mas acho que se Toriyama tivesse terminado na Saga Freeza, então ele teria criado um terceiro mangá de sucesso”, disse Torishima. Até o momento, Toriyama teve dois sucessos: Dr. Slump e a série Dragon Ball. Ambos foram sucessos estrondosos.
Livedoor News observa que desde a estreia de Dragon Ball, Toriyama não iniciou nenhum mangá novo e de longa duração. Ele fez inúmeras séries curtas, mas nada tão grande e contínuo quanto Dr. Slump ou Dragon Ball. Dr. Slump estreou em 1980 e Dragon Ball começou em 1984. E aqui estamos em 2015.
Entrevista com Kazuhiko Torishima no site Forbes (15 de outubro de 2016)
KAZUHIKO TORISHIMA FALA SOBRE O SUCESSO DE DRAGON BALL E AS ORIGENS DE DRAGON QUEST!
Uma das principais figuras do mangá e dos jogos no Japão é Kazuhiko Torishima. Originalmente um editor da Weekly Shonen Jump, supervisionando títulos como Dr. Slump e Dragon Ball, ele também teve uma participação importante na criação de séries de jogos como Dragon Quest. Tive a sorte de encontrá-lo recentemente e descobrir mais sobre o trabalho que ele fez ao longo dos anos.
Hoje, Torishima é presidente da editora Hakusensha, tendo assumido essa função em 2015, e foi aqui que consegui sentar e conversar com ele sobre sua vida e obra.
Nasci em Niigata, em uma cidade chamada Ojiya, e sua população é de apenas cinquenta mil pessoas. Isso significava que, desde o início do jardim de infância até a formatura do ensino médio, todos os seus colegas são iguais. Logo, uma comunidade muito pequena.
O que acontece quando você cresce em uma situação como essa é que você acaba não gostando desse tipo de comunidade pequena. Então, eu realmente não gosto de voltar para minha cidade natal. É bastante sufocante, nada parece realmente mudar. Sem falar que lidar com pessoas lá é incrivelmente complicado, pois você tem que estar superciente de tudo que você faz ou fala.
Então, quando você não tem base financeira para escapar desse tipo de comunidade, sua única opção é ler muitos livros, já eles permitem que você escape para um mundo diferente. Então, ler muito me ajudou a sobreviver até que eu vim para Tóquio.
Eu estava curioso para saber como seu fascínio pela leitura se desenvolveu em seu papel como editor de mangá, mas como ele explica, não era isso que ele realmente pretendia.
Quando eu estava na quarta série do ensino fundamental, estava fazendo xixi no mictório e havia uma janela bem na minha frente. Através disso eu pude ver a lua. Naquele momento, pensei que não só eu estava olhando para a Lua, mas que a Lua estava olhando para mim, um garotinho fazendo xixi. Isso me fez sentir muito pequeno e questionar meu lugar no universo. Era uma grande questão sobre ser humano e também sobre minha existência. Esse tipo de pergunta realmente capturou minha imaginação cada vez mais, de modo que me empurrou para a leitura de filosofia. Especificamente, acabei lendo muito confucionismo, Nietzsche e Pascal. Portanto, mesmo quando estava no ensino fundamental, li livros muito difíceis como esses.
Eu leio muito sobre filosofia, mas há muitas mentes talentosas ao longo da história e todas elas dizem muitas vezes coisas diferentes e contraditórias. Isso ficou muito difícil, então parei e fui para os romances eróticos.
Como minha casa não era muito rica, não tinha dinheiro para comprar mangá por mim mesmo. Isso significava que se eu quisesse um mangá, teria que pedir aos meus pais. No entanto, naquela época, os pais geralmente desaprovavam esse tipo de coisa. Isso significava que se eu lesse algo como livros, poderia ir para a biblioteca local; às vezes, se houvesse literatura francesa, você também poderia encontrar romances eróticos. Então, acabei visitando várias bibliotecas diferentes e peguei todos os tipos de livros interessantes.
A razão pela qual eu originalmente quis entrar na Shueisha foi por causa da revista mensal Playboy, que havia começado um ano antes de eu entrar na empresa. Naquela época, a Playboy era única. Continha muitos contos e novelas de altíssima qualidade de autores famosos no Japão e no exterior. A primeira edição também esgotou em um dia no Japão, por isso foi extremamente popular. Então eu queria entrar para o time da Playboy e não tinha ideia que a Shueisha publicava tantos mangás. Isso foi em 1976, eu acho.
Depois que recebi a oferta de trabalho da Shueisha, é claro que eles começaram a enviar suas várias publicações para mim como referência. Ao receber muitas caixas grandes, comecei a ter um mau pressentimento quando pareciam conter apenas mangás. Então esse foi o primeiro contato real que tive com mangás.
COMEÇANDO NA SHUEISHA E APRENDENDO SOBRE MANGÁS
Considerando que seus interesses literários não tinham a ver com manga, Torishima fez uma abordagem interessante para sua situação. Em vez de simplesmente desistir, ele fez o possível para entender e principalmente analisar os mangás. É essa abordagem analítica que o diferenciava e o ajudava a se firmar em sua nova função, como ele diz: “Então, quando entrei na Shueisha, eles decidiram que eu deveria trabalhar na equipe do Weekly Jump, mas não sabia o que isso significava , já que não lia mangás. Foi um grande choque, pois não só trabalharia com mangás, mas em um periódico que não conhecia.
Naturalmente, comecei a ler a Jump depois que comecei, pois era minha equipe e meu trabalho, mas não era nada divertido. Como eu também era um novato na equipe, tive que escrever um relatório diário para meu gerente, parte disso foi que eu tive que incluir minha classificação semanal dos diferentes mangás dentro da Weekly Jump, escolhendo os que eu achava mais divertidos. Então fiz essa lista de classificação, mas a Weekly Jump também faz algo semelhante, pedindo aos leitores que votem em suas séries favoritas. Isso aconteceria duas ou três semanas depois. Infelizmente para mim, as duas listas eram totalmente diferentes, quase opostas na verdade.
Diante disso, eu tinha que fazer algo, mesmo que eu lesse a Weekly Jump, simplesmente não achava divertido. Os desenhos não eram bons e depois de ler a Jump, seus polegares ficavam pretos por causa da tinta usada. No entanto, houve duas coisas que me mudaram. A primeira coisa foi que, naquela época, eu estava no comando de uma série de mangás chamada Doberman Deka, ilustrada por Shinji Hiramatsu. Já havia sido decidido que o mangá terminaria sua publicação em alguns meses, pois estava indo muito mal no ranking de popularidade dos leitores. No entanto, da minha perspectiva, eu achava que Hiramatsu era muito bom em desenhar cenas de ação, mas era muito ruim em desenhar mulheres. Todas pareciam iguais. Ele não conseguia diferenciar as personagens. Como Doberman Deka era uma história original, decidiu-se adicionar um novo personagem que seria uma policial. Hiramatsu desenhou essa nova personagem, mas eu não gostei nada. Então saí e comprei uma revista famosa chamada Myojo, uma revista sobre atores e ídolos. Essa revista também tinha uma edição separada que cobria a classificação dos ídolos na época. A ídolo número um era Sakakibara Ikue, enquanto ela está na casa dos 50 agora, naquela época, era muito jovem e bonita. Então eu pensei que esse tipo de rosto poderia se tornar muito popular em um futuro próximo e pedi a Hiramatsu para mudar o rosto da nova personagem para combinar com essa ídolo. Depois disso, a classificação do Doberman Deka mudou drasticamente, de décimo sétimo lugar para terceiro. Então, essa cadeia de eventos me fez pensar que meu trabalho poderia ser realmente interessante.
A segunda coisa era que, ao lado do prédio da Shueisha, ficava o escritório da Shogakukan, os proprietários da Shueisha. Dentro daquele prédio havia um enorme arquivo de tudo que eles já haviam publicado. Então, todos os mangás e revistas da Shueisha e Shogakukan. Como eu era um novato na equipe, tive que vir para o trabalho mais cedo. No entanto, eu era muito rápido no meu trabalho e, depois de terminá-lo, alguns dos membros da equipe sênior podiam me pedir para fazer tarefas para eles. Eu não gostava nada disso, então sempre fugia do escritório depois que meu trabalho terminava e me esgueirava para o grande arquivo do prédio Shogakukan. Lá eu comecei a ler muitos mangás clássicos e encontrei alguns trabalhos realmente ótimos. Curiosamente, a maior parte dos mangás que eu realmente gostei eram para meninas, ao invés de meninos. Meus favoritos na época provavelmente eram Kaze to Ki no Uta, de Keiko Takemiya, e Poe no Ichizoku, de Moto Hagio, além de algumas obras de Mitsuru Adachi. Ler todos esses mangás me fez perceber que, na verdade, havia muitos mangás ótimos por aí. No entanto, os mangás dentro da Weekly Jump não combinavam com o que eu pensava ser tão bom. Eu simplesmente não gostava dos mangás da Weekly Jump, mas agora sabia que havia muitos mangás excelentes fora dela.
Para explicar, o mangá dentro do Weekly Jump naquela época não tinha inteligência ou profundidade, a qualidade do desenho também era péssima.
Então, essas duas coisas me fizeram pensar que eu deveria configurar e ajudar a criar um mangá que eu achasse interessante. Se aqueles mangás pudessem ganhar o ranking do leitor, então tudo ficaria bem.
Depois de tudo isso, comecei a ler muito mangá, pois agora sabia que poderia haver grande mangá fora do Weekly Jump. A coisa boa também era que, como eu nunca tinha lido mangá antes, isso significava que eu poderia tentar de tudo. Então, eu não tinha preconceitos.
Depois de todo esse estudo e análise, Torishima teve uma revelação muito importante sobre o mangá em si, conforme explica:
Depois de ler muito mangá, percebi que existem dois tipos principais, o primeiro é fácil de ler e o outro é difícil. Para explicar, quando é fácil de ler, as páginas simplesmente fluem por entre seus dedos. Quando é mais difícil, você tem que voltar algumas páginas para verificar o que estava acontecendo. Como tal, descartei todos os mangás que achava que se enquadravam na segunda categoria. Restava apenas o mangá fácil de ler e o melhor era Ore wa Teppei, de Tetsuya Chiba.
Cada série semanal de um mangá tem 19 páginas, então peguei o primeiro capítulo de Ore wa Teppei e analisei painel por painel e ângulo por ângulo. Tentando entender por que esse painel tinha que ser assim, ou por que Chiba havia escolhido aquele ângulo. Acho que li aquele fascículo cerca de cinquenta vezes.
Com essa experiência, entendi como uma página deve ser dividida em painéis e que essa era a coisa mais importante que um mangá tinha que acertar. Além disso, aprendi como você fazia o layout em cada painel para torná-lo fácil de ler. Nesse sentido, acho que aprendi as regras por trás do que fazia a estrutura de um bom mangá funcionar. O resultado de tudo isso foi que tentei aplicar o que havia aprendido aos autores de mangá com quem estava trabalhando.
Depois disso, os autores de mangá ficaram cada vez melhores. Muitas vezes, os novos autores estreariam não na Weekly Jump, mas em uma edição especial e, depois de aplicarem minhas técnicas, eles obteriam uma melhor posição no ranking.
TRABALHANDO COM AKIRA TORIYAMA E A CRIAÇÃO DE DR. SLUMP E DRAGON BALL
Uma das colaborações editoriais mais famosas de Torishima foi com Akira Toriyama. À medida que os trabalhos de Toriyama alcançavam um enorme sucesso, eu queria saber mais sobre como Torishima havia guiado o, até então, autor de mangá iniciante.
Nessa época, conheci e comecei a trabalhar com Akira Toriyama. Então, quando ele começou, era obviamente um recém-chegado como autor de mangá, mas eu também era um recém-chegado como editor. Embora eu achasse que tinha um bom domínio e habilidade no layout dos painéis, costumávamos discutir e havia muitas tentativas e erros.
Depois de 18 meses trabalhando juntos, Toriyama veio com o primeiro rascunho de Dr. Slump. Logo depois que Toriyama mudou de escritório, ele aparentemente encontrou cerca de 500 páginas de mangá que eu rejeitei. Acho que na época de Dr. Slump, provavelmente fazia três anos que Toriyama trabalhava para a Shueisha.
Então, para esclarecer, durante aqueles anos, Toriyama veio com todos os tipos de coisas e eu apenas diria “não”.
O resultado de tudo isso foi que, quando Dr. Slump estreou na Weekly Jump, ele começou em segundo lugar no ranking de leitores. Então, tudo começou com muito sucesso.
Como o título diz Dr. Slump, originalmente Arale não era para ser o personagem principal. Ela foi apenas uma personagem convidada para o primeiro episódio. No entanto, eu realmente amei as personagens femininas que Toriyama criou, então eu queria usar Arale como personagem principal. Toriyama pensava de forma diferente, como a Weekly Jump foi feita para meninos, certamente uma menina não poderia ser uma protagonista. Então, apostamos em fazer de Arale a personagem principal.
Por isso, desafiei o Toriyama a fazer uma edição especial com uma garota como protagonista e fizemos uma aposta sobre onde ela entraria no ranking. O resultado seria que, quem chegasse mais perto da classificação final, poderia ter a palavra final. Naturalmente, ganhei e fiz de Arale a personagem principal. Enquanto eu ganhei a aposta, Toriyama é bastante teimoso e se recusou a mudar o nome do mangá de Dr. Slump para outra coisa. Então, eu me comprometi com isso.”
No entanto, um dos aspectos mais famosos dessa colaboração em Dr. Slump é que Toriyama criou o vilão Dr. Mashirito. Na verdade, este era para ser Torishima, já que o nome “Mashirito” é uma inversão de seu nome. Considerando que a aposta anterior resultou em Arale se tornando a protagonista de Dr. Slump, eu queria saber se isso teria catalisado a criação do Dr. Mashirito.
Quanto ao Dr. Mashirito, isso não tem nada a ver com esta aposta. Isso aconteceu porque Toriyama fez um esboço de uma nova história para um novo episódio, no qual um cientista louco iria aparecer. Embora a história fosse boa, o personagem do cientista louco não era forte o suficiente. Eu sabia pelo Doberman Deka que o visual do personagem era muito importante, então disse a Toriyama que o atual cientista maluco estava muito fraco e ele precisava voltar e encontrar alguém realmente desagradável, com um grande impacto. Então eu disse a ele para imaginar a pessoa que ele mais odeia e pensar na pessoa mais desagradável do planeta. Que ele tinha que desenhar isso com toda sua paixão e emoção.
Então, esperei e esperei, mas não recebi o exemplar até o prazo, o que significava que não tinha tempo para alterá-lo. De qualquer forma, Toriyama deu ao cientista louco minha cara e mudou seu nome para Dr. Mashirito, que é meu nome ao contrário. Minha reação foi, “ok, ele fez isso.”. Minha única esperança era que, se o personagem fosse impopular, seria um caso isolado, mas infelizmente todos amaram.
Isso tudo ficou bem famoso muito rapidamente porque, naquela época, depois de cada episódio, havia um pequeno mangá e Toriyama já havia escrito sobre mim em um desses, antes do Dr. Mashirito. Então, todos sabiam que o Dr. Mashirito era para ser eu.
Dr. Slump foi um grande sucesso, mas não demorou muito para que Toriyama quisesse tentar algo diferente, como explica Torishima:
Embora Dr. Slump tenha começado com muito sucesso, depois de seis meses ou mais, Toriyama disse que não queria continuar, que queria parar. A razão era porque cada história de Dr. Slump era independente e terminava toda semana, e também era uma comédia. Isso significava que, se algo não funcionasse, Toriyama invariavelmente teria que mudar tudo. Portanto, era um fardo pesado.
Naturalmente, não fomos capazes de impedir Dr. Slump, pois era um mangá de primeira linha na Weekly Jump e a Shueisha iria querer continuar assim. Quer dizer, o mangá vendia regularmente 1 milhão de cópias e a adaptação do anime iria começar na TV. Portanto, tivemos que continuar.
No entanto, conversei com o editor-chefe da Weekly Jump sobre tudo isso. Sua resposta foi que, se pudéssemos inventar algo mais interessante e bem-sucedido que Dr. Slump, certamente faríamos isso.
Então, eu e Toriyama conversamos longamente sobre o que deveríamos fazer. No entanto, antes disso, tivemos que reestruturar o fluxo de trabalho de Dr. Slump. O que significa que cada capítulo teve que ser feito em 5 dias, ao invés de 7, deixando os últimos 2 para trabalharmos no novo projeto.
Durante esses 2 dias começamos a trabalhar no novo projeto. Conversamos muito e tivemos muitas reuniões sobre o que deveria ser. Quando começamos, pensei, por ser um editor de mangá de sucesso e o Toriyama um autor de mangá brilhante, que inventar algo novo seria fácil. No entanto, tivemos muitas ideias, mas estava claro que nenhuma delas teria sucesso.
Depois de um tempo, pensei que não poderíamos continuar esse processo para sempre, então talvez tivéssemos apenas mais uma reunião neste novo projeto. Então fui a Nagoya para encontrar Toriyama, mas mesmo depois de conversar o dia todo até o último Trem-Bala de volta a Tóquio, não pudemos pensar em nada de bom.
Antes de eu sair do escritório de Toriyama, sua esposa nos trouxe um chá e ela começou a falar sobre como seu marido era estranho e único. A esposa de Toriyama também costumava ser autora de mangá e ela me disse que é muito comum os autores de mangá ouvirem rádio ou música quando estão desenhando, pois seus ouvidos estão livres. Porém, Toriyama era diferente, pois gostava de assistir um filme gravado na TV, enquanto trabalhava. Achei muito interessante porque, para desenhar mangá, é preciso se concentrar e olhar o que está desenhando. A esposa de Toriyama disse que, mesmo que seu marido não assistisse ao filme, ele sabia o que estava acontecendo, mas se fosse uma parte que ele estivesse interessado, ele levantaria a cabeça e assistiria. Perguntei a Toriyama o que ele assistia enquanto desenhava mangá e ele disse que via principalmente os filmes de kung-fu de Jackie Chan. Eu também perguntei se ele poderia dizer o que estava acontecendo apenas pela fala do personagem e ele disse “sim, eu assisti esses filmes mais de cinquenta vezes”.
Então eu disse que, se ele gostava tanto de filmes de kung-fu, por que não tentar um mangá de ação de kung-fu para o próximo projeto? Depois disso, Toriyama apareceu com um conto muito curto de 13 páginas, chamado: Dragon Boy. Esta história obteve uma classificação incrivelmente boa na Weekly Jump.
Esta versão da história é anterior a qualquer um dos elementos de Jornada ao Oeste e essa foi uma ideia minha que veio depois. A maior razão para isso era que era uma propriedade intelectual gratuita, pois era muito antiga. Além disso, quando você tem que fazer uma longa série de mangá, precisa adicionar muito mais recursos em relação a algo, como o episódico Dr. Slump. Portanto, em Jornada ao Oeste, você tem muitas engenhocas, como o bastão e a nuvem voadora. Então, quando mudamos Dragon Boy para um formato de história longa, foi quando os elementos de Jornada ao Oeste entraram.
Uma das outras grandes razões pelas quais gostei de Jornada ao Oeste como uma influência foi porque, com Dr. Slump, a história aconteceu principalmente em algo como a Costa Oeste dos EUA, no ambiente e no cenário geral. No entanto, como estávamos tentando começar algo novo, pensei que precisávamos de uma configuração quase oposta. Naquela época, a China não era um tópico popular nos mangás e achei que isso nos faria destacar, por sermos únicos e novos. Queríamos que a história operasse em um mundo muito diferente daquele de Dr. Slump, então o oposto da Califórnia, para mim ,era algo como a China.
Na verdade, eu queria fazer tudo completamente diferente. O oposto de Dr. Slump. O protagonista não seria uma menina, mas um menino. Mova a configuração da Califórnia para a China. Mude o foco da comédia para a história.
MUDANDO O FOCO DE DRAGON BALL E LIDANDO COM ADAPTAÇÕES DE ANIME
Com a mudança para Dragon Ball, a série evoluiu substancialmente ao longo de sua execução. No entanto, muito disso também estava relacionado à forma como as adaptações do anime foram planejadas.
O que é realmente importante em mangás para meninos é que você precisa fazer os leitores se sentirem conectados ao protagonista. É necessário que haja uma conexão emocional muito forte do leitor com o protagonista. Que eles se vejam como esse personagem. Então, se o protagonista de Dragon Ball era um macaco, que era o plano original, ninguém poderia se relacionar com isso.
Originalmente, começamos Dragon Ball como uma espécie de filme de estrada baseado em Jornada ao Oeste, mas a classificação começou a diminuir gradualmente. Então, discutimos sobre por que esse tipo de história não estava ressoando com os leitores e por que não estamos indo bem nas classificações. A conclusão a que chegamos foi que Goku, o protagonista, não era forte o suficiente. Que ele não ressoou muito bem com os leitores. A partir daí, discutimos muito sobre como Goku deveria ser. A resposta foi que Goku quer ficar cada vez mais forte. Para prosseguir com esse tema, decidimos esquecer todos os personagens anteriores, exceto Goku e Mestre Kame. Para fortalecer ainda mais este tema, adicionamos um novo personagem chamado Kuririn. Focando principalmente em três personagens, fizemos novos capítulos baseados no treinamento de Goku. Além disso, para mostrar como Goku ficou mais forte, tivemos um grande torneio na história. Depois de tudo isso, o ranking novamente voltou ao topo.
Mesmo depois do sucesso do primeiro torneio da história, nós dois pensamos naquele ponto que Dragon Ball não era um mangá forte. Faltou alguma coisa. Novamente, tivemos muitas reuniões e discussões. Então, percebemos que não tínhamos um bom vilão. Alguém realmente mau, que dá a Goku a motivação para derrotá-lo. Como Dragon Ball teve algum legado de Dr. Slump, a primeira parte da série teve um tom um pouco cômico. Isso significava que até os vilões eram fofos ou engraçados demais. Portanto, precisávamos de vilões fortes para tornar Goku mais atraente para os leitores.
A partir daí, pensamos no que faz um bom vilão, como seria um vilão realmente malvado. Então, passei por todas as pessoas más em que pude pensar na história global e apresentei-as a Toriyama. A cada dia eu apresentava uma figura histórica e explicava como ele era mau. Depois de cerca de 10 pessoas, cheguei ao imperador romano Nero. Diz-se que Nero tinha muito prazer em ver outras pessoas sofrerem. Essa explicação realmente atingiu Toriyama e ele entendeu que isso é o que um vilão seria, que é o mal. A partir disso, Piccolo foi criado.
Este também foi o ponto de partida para o desenvolvimento futuro da série Dragon Ball, incluindo todos os futuros elementos alienígenas.
Nessa época, também tivemos todas as várias adaptações de anime de Dr. Slump e Dragon Ball acontecendo. No entanto, da minha perspectiva, o anime Dr. Slump não foi bem sucedido. Isso porque eles não podiam fazer o anime ser tão fiel ao mangá original. Desviava muito da obra original. A razão para isso foi porque foi a primeira vez que a equipe da Weekly Jump teve que gerenciar uma adaptação de anime baseada em um de seus mangás. Portanto, ninguém sabia como controlar o lado anime das coisas, ou gerir o processo criativo dessa forma. Como eu penei muito com esse tipo de coisa em Dr. Slump, fiz uma lista de tudo que deu errado e não funcionou corretamente. Isso me motivou a lidar com as coisas de forma muito diferente para Dragon Ball.
Muito parecido com as técnicas que aprendi sobre como o mangá deve ser apresentado e como os painéis devem ser usados, tentei aprender as melhores práticas para o anime. Não só pelo aspecto criativo, mas também pelo lado comercial. Também conversei com a equipe de Doraemon, na Shogakukan, sobre como eles gerenciavam o lado comercial e criativo. Tentei usar tudo isso para Dragon Ball.
A coisa mais importante que aprendi é que você tem que manter o controle em termos de tomada de decisão. O que deu errado com Dr. Slump foi que, uma vez que algo fosse feito no anime, nós queríamos mudar isso. Porém, sempre era tarde demais, pois já havia sido animado. Então, para Dragon Ball, criamos uma grande bíblia para a série, incluindo todo o merchandising, antes mesmo de começar a produção do anime. Também trabalhamos muito mais e fizemos o nosso melhor para controlar todo o processo.
Embora tentássemos fazer o anime Dragon Ball melhor do que o de Dr. Slump, as avaliações ainda caíram gradualmente. Então, tentamos descobrir por que isso estava acontecendo, por que a série não estava indo bem? Uma coisa que descobrimos foi que o produtor do anime Dragon Ball era o mesmo de Dr. Slump. Como ele tinha uma imagem do mangá de Toriyama como sendo algo fofo e engraçado, seu estilo de Dragon Ball se tornou muito parecido com o de Dr. Slump. Isso significava que ele estava perdendo o tom mais sério que desenvolvemos no mangá. Por exemplo, quando vi a cena no anime em que Goku perfura Piccolo, percebi que não poderia trabalhar com esse produtor.
Então conversei com o estúdio e pedi para trocar de produtor. Isso era algo que nunca tinha acontecido antes, pois era uma empresa totalmente diferente.
Na mesma época, Saint Seiya era um anime muito popular. Isso foi interessante porque o mangá de Saint Seiya era bem mediano, mas o anime, em comparação, era muito melhor. Então, eu queria saber por que o anime de Saint Seiya estava indo tão bem e fizemos algumas pesquisas sobre isso. Descobrimos que havia dois valores-chave. O primeiro foi Kouzou Morishita, que foi o diretor, e o segundo foi Takao Koyama, que escreveu o roteiro. Então eu visitei esses dois caras e perguntei se eles me ajudariam a reiniciar (reboot) Dragon Ball e ambos concordaram.
Além de tudo isso, Toriyama estava pedindo para mudar o design do personagem de Goku, de proporções mais fofas para algo mais alto e musculoso. Quando ouvi isso pela primeira vez, argumentei muito com ele sobre isso, porque eu achava que a coisa mais importante com os quadrinhos masculinos era fazer o personagem principal ressoar entre os leitores. Então, se você mudar as proporções do personagem, será alguém totalmente novo para os leitores. Minha primeira reação a tudo isso foi dizer para não mudar o Goku, mas a explicação de Toriyama era muito lógica e a única opção era eu concordar. Essa explicação era que, já que as batalhas estavam se tornando cada vez mais sérias no mangá e você tinha um vilão adequado na forma de Piccolo, que era mais alto que Goku, tudo isso significava que, se tivesse que desenhar uma batalha séria, você precisava mostrar os músculos de Goku, assim como ações fortes para seus socos e chutes. Logo, a fim de desenhar esses tipos de ações neste contexto, significava que Goku precisava ter proporções mais altas e mais músculos.
Isso também foi algo que Toriyama teve que fazer, de qualquer maneira, nos capítulos anteriores do mangá, já que ele seria forçado a distorcer as proporções de Goku para fazer as lutas funcionarem. Além do mais, após cada batalha, Goku voltava à sua forma mais bonita e menor. Esse tipo de discrepância realmente o incomodava. Então, sua resposta foi simplesmente que eu aprovaria essas mudanças em Goku ou que ele pararia de fazer Dragon Ball.
Tudo isso foi ótimo, pois tínhamos também todas essas mudanças de equipe acontecendo na animação. O novo produtor do anime também foi muito inteligente e disse que, se tivéssemos um novo título, em que Dragon Ball terminaria e começaríamos um novo programa, isso significaria que o anime receberia mais dinheiro para promoção. Portanto, decidimos ir com um título diferente e personagens atualizados, com proporções maiores, e tivemos uma reunião para esse novo título, mas não pudemos pensar em nada bom. Fui e pedi a opinião de Toriyama e ele respondeu imediatamente dizendo “Dragon Ball Z”. Eu perguntei “por que Z?” e ele disse “porque isso é o último, nada vem depois disso.”
Como todos sabemos, Dragon Ball Z não foi a última parcela da série, mas é interessante saber que era a intenção de Toriyama, pelo menos.
FAMICOM SHINKEN E AS ORIGENS DE DRAGON QUEST
Considerando que Toriyama estava muito envolvido com jogos como Dragon Quest, eu queria saber se Torishima tinha algo a ver com isso. Descobriu-se que seu papel foi integral.
Eu estava profundamente envolvido no início de Dragon Quest, junto com a Shueisha, obviamente. O escritor de roteiros, Yuji Horii, também começou como autor na Weekly Jump. Ele foi apresentado a mim por outro escritor, Akira Sakuma, que havia feito Momotaro Densetsu, e os dois estiveram uma vez na Weekly Jump. Fui apresentado porque as pessoas sabiam que eu gostava de jogos de fliperama e me disseram que Horii realmente gostava de jogos. Em termos de jogos que costumava jogar nas salas de jogos, adorava Xevious.
Um dia, a Weekly Jump teve um prêmio para os leitores, que era um dos portáteis Game & Watch da Nintendo. Como se sabia que era um grande fã de jogos, coube a mim administrar isso. No entanto, achei que não era divertido apenas dar prêmios aos leitores; deveríamos fazer algumas páginas especiais na Weekly Jump sobre jogos. Achei que talvez Horii pudesse me ajudar. Então foi assim que as páginas relacionadas aos jogos começaram na Weekly Jump.
Começamos essas páginas de jogos na Weekly Jump e, por um tempo, apresentamos jogos para PC, mas naquela época os PCs eram incrivelmente caros. Portanto, esse tipo de hardware estava fora do alcance da maioria dos jovens leitores da Weekly Jump. Isso nos forçou a mudar nosso foco para o Family Computer da Nintendo, ou Famicom, e o MSX. Fizemos esse tipo de página de recursos por um tempo, mas eles não foram muito bem e pensamos em encerrá-lo.
Logo depois de terminarmos as páginas iniciais de jogos na Weekly Jump, meu empresário veio até mim com uma cópia recente da CoroCoro Comics e me disse que eles estavam indo muito bem. A razão por trás disso era que eles tinham páginas especiais lacradas, que você não podia ler na loja. Você tinha que comprar sua cópia e, em seguida, abrir essas páginas especiais em casa. Parece que essas páginas seladas especiais foram a chave para esse sucesso e me pediram para investigar mais e descobrir o que estava escrito nessas páginas seladas.
Fizemos a pesquisa na CoroCoro Comics e descobrimos que o conteúdo dessas páginas lacradas eram cheats ou técnicas especiais para jogos. Nesse ponto, eu soube imediatamente qual era a causa de seu sucesso.
Como resultado, tentamos algo semelhante na Weekly Jump e, como vendemos mais, isso significa que tínhamos mais dinheiro. Significava que poderíamos optar por ter quatro cores nessas páginas especiais, enquanto a CoroCoro Comics poderia fazer apenas duas cores. Portanto, além desse aumento nas cores, também decidimos avaliar os jogos. ”
Naquela época, ninguém classificava os jogos assim, mas considerando que a maioria dos jogos era muito caro para as crianças, significava que todos queriam saber quais eram os jogos bons ou ruins. Tudo isso foi antes da Famitsu, obviamente, por volta de 1985.
Estas novas páginas de jogos seladas saltaram para o 3º lugar na classificação dos leitores da Weekly Jump.
Como resultado, eu disse ao meu gerente que iríamos buscar cheats e análises de jogos para essas páginas especiais, mas eu o avisei que as empresas de jogos iriam até a Shueisha para reclamar, para tentar nos impedir de divulgar cheats, bem como revisar seus jogos. Então, disse a ele que tínhamos que ser protegidos para fazer isso. Que as empresas de jogos não poderiam se envolver no que fizéssemos. Felizmente, meu gerente prometeu nos proteger, então seguimos em frente.
Como eu esperava, muitas empresas de jogos como Hudson, Konami e Namco vieram reclamar com a Shueisha. Eles argumentaram que divulgar cheats e avaliar jogos era uma violação de sua propriedade intelectual. Já havíamos conversado com nossos advogados na Shueisha e a posição deles era que, como cada jogo era vendido publicamente, isso significava que a Shueisha havia comprado o jogo e que estávamos apenas fazendo referência ao que já havíamos comprado. Portanto, isso não poderia ser uma violação de propriedade intelectual.
Como esses tipos de empresas de jogos sempre tentam esconder as coisas de seus clientes, não poderiam ser muito fortes contra uma empresa tão grande como a Shueisha.”
Este foi o nascimento da Famicom Shinken. Um recurso de jogos extremamente famoso no Japão e que lançou as bases de muitos que viriam a seguir. A preocupação de Torishima com a interferência das empresas de jogos era presciente e, infelizmente, algo assim ainda atormenta a grande imprensa de jogos em todo o mundo atual.
O nome da seção de jogos da Weekly Jump era interessante, pois vinha do mangá de muito sucesso, Hokuto no Ken. O termo “shinken” foi usado para descrever o tipo de arte marcial que Kenshiro usou no mangá, a Hokuto Shinken. O significado aqui era que esta seção de jogos na Weekly Jump daria aos jogadores o “sweetspot do jogo” sobre como conquistar cada jogo. Isso também foi mostrado quando os personagens da Famicom Shinken vestiram as roupas de Hokuto no Ken e apontaram para o leitor, da mesma forma que Kenshiro atacou os pontos de pressão de um oponente.
As classificações do jogo também não foram feitas com pontuações diretas, mas sim com uma quantidade de “atatatatata”, que era uma referência ao famoso ataque Hokuto Hyakuretsu Ken, que Kenshiro usou no mangá e anime.
Depois que começamos nossas páginas de jogos lacradas, não demorou muito para que revistas como a Famitsu aparecessem. No entanto, nossa seção de jogos era focada em cheats e só era feita por duas ou três pessoas. Além disso, costumávamos receber cerca de trinta mil cartas sobre jogos, de nossos leitores. Em comparação com a Famitsu, que até tentou fazer a engenharia reversa dos cartuchos do Famicom, percebemos que atingimos nosso limite no que podíamos fazer.
Tivemos então uma nova ideia, pois nossa estrutura atual estava no limite. A ideia era mostrar aos nossos leitores como um jogo é desenvolvido. Começando desde as fases iniciais do conceito, até a produção. Como se tratava de um jogo nosso, as informações seriam exclusivas. Então foi assim que Dragon Quest começou.
Nessa época, Horii começou seu trabalho na Enix, em jogos como Portopia Renzoku Satsujin Jiken e Okhotsku ni Kiyu: Hokkaido Rensa Satsujin Jiken. Além disso, eu e minha equipe éramos loucos por RPGs da Apple, como o Ultima. Então, pensei que deveríamos fazer um jogo de RPG com Horii como escritor. No entanto, se tivéssemos apenas essas coisas, isso significaria que não teríamos a justificativa para incluí-lo na Weekly Jump. É por isso que decidi adicionar Toriyama ao projeto para os designs de personagens.
Em termos de desenvolvimento do jogo, a Enix pagou por tudo isso. A Shueisha não investiu. Além disso, a Shueisha não seria proprietária da propriedade intelectual. Isso foi algo que fiz intencionalmente. A principal razão para isso era que meu empresário não entendia de jogos. Isso significava que, se Shueisha estivesse envolvida no lado da propriedade intelectual das coisas, todas as decisões teriam que passar por meu gerente. Então, separei intencionalmente o projeto da Shueisha, para evitar que o jogo fosse arruinado.
Tudo isso significou que tínhamos cobertura exclusiva para Dragon Quest na Weekly Jump e outra coisa que ajudou a convencer meu empresário foi que poderíamos publicar um livro sobre o jogo. Devido ao nosso acordo sobre o jogo, também significava que não precisávamos pagar royalties à Enix.
Nessa época, eu era apenas um editor, não um editor-chefe ou gerente. O que eu queria evitar era ter a Shueisha envolvida no projeto. Isso reduziria drasticamente a produção do jogo, pois cada decisão precisaria de aprovação externa. Isso significava que eu tinha que dar a Shueisha algum benefício em outro lugar, como conteúdo exclusivo e sem necessidade de pagar royalties. Com o último nos permitindo fazer um mangá do jogo, se quiséssemos.
Torishima ainda é um jogador interessado e ativo e ficou feliz em falar sobre os jogos que ele amava, bem como aqueles que ele joga atualmente.
“Em termos de jogos que eu realmente amei, suponho que sejam Wizardry e Ultima. Amo jogar jogos mesmo agora. Não leio mangá fora do escritório, mas em casa, ainda jogo. Atualmente, jogo no meu smartphone coisas como Terra Battle e Lord of the Dragons. Em termos de jogos de console, eu jogo coisas como Odin Sphere e Dark Souls III no PS4.
“Na Tokyo Game Show deste ano, também tive a oportunidade de testar o PlayStation VR e joguei Summer Lesson, que foi uma experiência única para mim. Como resultado, fui visitar a Bandai Namco para conhecer Katsuhiro Harada. ”
DEFENDENDO A INTEGRIDADE DO MANGÁ E OS SEGREDOS DE UM BOM EDITORIAL
Mais recentemente, Torishima se envolveu na luta contra um projeto de lei governamental de Tóquio que teria dificultado seriamente a expressão criativa tanto do mangá quanto do anime.
“Em relação ao Bill 156, vi dois problemas principais com ele. A primeira era que um corpo político estava tentando decidir a direção da expressão criativa. A segunda parte foi que, no projeto de lei, o governo de Tóquio tentou discriminar especificamente os mangás e animes, ignorando o conteúdo de filmes ou romances. Nesse sentido, essas novas restrições serão aplicadas apenas a mangás e animes. Já com filmes e romances, eles podiam fazer o que quisessem. Resumindo, o governo viu o mangá e o anime como algo inferior aos outros meios de comunicação e isso não é bom.
“Hoje em dia, o governo de Tóquio incentiva os turistas a visitar a cidade para ver coisas relacionadas com mangás e animes, porque eles querem a receita do turismo. Então eles fizeram eventos como a Tokyo Anime Fair, que agora é a AnimeJapan. Enquanto o então governador de Tóquio, Shintaro Ishihara, tentava discriminar injustamente animes ou mangás, em oposição a filmes ou romances. Portanto, essas duas coisas obviamente conflitavam e, como tal, tentei lutar contra isso.
“O problema que vi foi que o prefeito Ishihara também era um autor de romances. Nesse sentido, ele provavelmente pensou, de sua perspectiva, que mangá e anime estão abaixo, algo apenas para crianças. Portanto, eles podem ser capazes de usar os recursos turísticos, mas ele claramente não vê o mangá ou anime como uma ferramenta de expressão criativa, enquanto que, para mim, devem ser tratados da mesma forma.
“Agora que Ishihara não é mais o governador e o governo de Tóquio se retirou de coisas como a Tokyo Anime Fair, atualmente, esse evento, chamadoo AnimeJapan, é administrado diretamente pela indústria de animação, então eu acho que está tudo muito mais saudável, em uma posição muito melhor.
“Quanto à nova governadora e seu plano de transformar Tóquio em uma terra de anime, não gosto de me envolver com política, se puder evitar.”
Com isso por trás, Torishima está olhando para o futuro e como ele pode transmitir o conhecimento e a experiência que aprendeu.
Hoje em dia, sou o presidente da Hakusensha. Meu mandato é de dois anos e meio. Durante minha estada aqui, quero promover os jovens editores e, como tal, estou conduzindo encontros com eles. Para cada sessão, há quatro jovens editores e eu. Nesse tempo eles têm que conversar sobre dois assuntos; “O que eu faria se fosse o presidente da Hakusensha” e “o que eu faria se fosse o editor-chefe”. Então, eles escolhem um e falam livremente sobre. A razão por trás disso é que, devido à cultura da empresa, as pessoas não são realmente treinadas para ouvir o que seus colegas dizem e também para falar quando você sentir que algo não está certo. É muito hierárquico. Portanto, esse tipo de debate não é algo para o qual a maioria das pessoas é treinada aqui. No entanto, essas habilidades são absolutamente essenciais para se tornar um editor. Como eles têm que falar e muitas vezes discutir longamente com os autores de mangá, quero promover esses jovens editores enquanto estou na Hakusensha. Se eu puder promover apenas um bom editor, eles poderão gerenciar pelo menos dez bons autores de mangá no futuro. Portanto, acredito que seja algo importante.
Recentemente, Kentaro Miura entrou em contato comigo para fazer uma entrevista sobre o Berserk. Logo, me sentei e li a série inteira para me preparar para isso. O que eu disse a ele naquela entrevista é que, se ele tivesse me conhecido muito antes, Berserk poderia ter sido muito melhor e provavelmente já teria terminado, com você trabalhando em algo novo, em vez disso.
Com todo o trabalho que fiz, só penso realmente no mercado e no público japonês. Então, nunca prestei muita atenção ao que estava acontecendo fora do Japão. Coisas como Dragon Ball passar a ser popular fora do Japão e ressoar com um público internacional. Uma coisa que aprendi com isso é que, se você trabalhar duro para fazer algo ótimo para um lugar, isso tende a funcionar globalmente. Um bom exemplo é com comida japonesa, como sushi ou ramen, que desenvolvemos para o nosso gosto. No entanto, ainda funciona para quase todas as pessoas no mundo. Contanto que você tenha a parte central, a parte essencial, realmente boa, funcionará em qualquer lugar.
A coisa mais importante e difícil de ser um editor de mangá é que você tem que organizar e cortar algo do trabalho de um autor de mangá talentoso. Você está lá para fazer com que seu talento e habilidade sejam elevados a um nível mais novo e mais alto. É como polir um diamante. Obviamente, você precisa de uma boa matéria-prima, mas se não poli-lo de uma forma inteligente, ela nunca brilhará.
“Para descobrir quais são as rochas simples ou os diamantes, você precisa polir.”
Poder falar com Torishima sobre todas as coisas que ele fez, desde ser um editor de mangá até começar efetivamente a imprensa de jogos japonesa, bem como a criação de Dragon Quest, foi totalmente fascinante.
Sua abordagem analítica calma era algo que eu gostaria que fosse mais prevalente nos círculos criativos. Muito frequentemente as decisões são tomadas com base na crença emocional do que na realidade de uma situação.
Embora seja triste pensar que em alguns anos ele se aposentará da Hakusensha, eu só espero que ele consiga incentivar editores mais jovens a seguir seus passos analíticos.
Em qualquer caso, está claro que, sem Torishima, o mundo do mangá, anime e jogos provavelmente seria um lugar muito diferente e também mais enfadonho.
Entrevista com Kazuhiko Torishima em comemoração aos 50 anos da Shonen Jump (17 de fevereiro de 2018)
Asahi: Aera Dot
50º ANIVERSÁRIO DA JUMP
O lendário ex-editor-chefe fala sobre a política da empresa em torno de Akira Toriyama
Aproximando-se do seu 50º aniversário em 2018, a Weekly Shonen Jump se tornou um tema importante, incluindo a participação em Oh My Jump!, um drama comemorativo que começou a ser exibido em Janeiro. No passado, a revista foi o lar de um editor que se tornou lendário no mundo dos mangás, o homem que foi o primeiro a descobrir os talentos de Akira Toriyama, nacionalmente estimado criador do mangá Dragon Ball. Ele também pegou o escritor Yuuji Horii e o levou ao mundo dos jogos, resultando no renomado RPG, Dragon Quest. Atuou como editor-chefe da revista, de 1996 a 2001, e atualmente é o presidente da Hakusensha. Seu nome é Kazuhiko Torishima (65 anos). Nos anos 80 e 90 a revista teve uma tiragem de mais de cinco milhões de exemplares, e ele relembrou conosco suas memórias daquela Era de Ouro.
Você disse que mal tinha lido qualquer mangá antes de entrar para o departamento editorial da Jump.
Eu li um pouco de mangá na escola primária. Eu sabia sobre a Sunday e a Magazine, mas a Jump ainda não existia na época. Eu só lia livros. Na escola primária, eu lia livros de filosofia e, na última metade do meu primeiro ano do ensino médio, estava realmente interessado na tradução de romances de países estrangeiros. Mais tarde, depois de terminar a faculdade, comecei a trabalhar na Shueisha e fui designado para o departamento editorial da Weekly Shonen Jump. Embora eu na verdade quisesse ser um editor da Monthly Playboy.
Como era o ambiente no departamento editorial da Jump naquela época?
Era bastante opressivo. Parecia uma escola só para meninos. Diferentes maneiras de fazer as coisas eram inaceitáveis. Os jovens funcionários não podiam se opor a nada, os novatos eram forçados a sair para beber e havia uma hierarquia rígida, muito parecida com uma equipe esportiva. A Jump é baseada nos três princípios de amizade, esforço e vitória, mas dentro do departamento editorial a ideologia parecia bem diferente (risos). A linha de pensamento de “é assim que os homens se comportam” não me agradava, mesmo naquela época. Esse tipo de ambiente simplesmente não combinava comigo.
E havia uma competição acirrada entre seus colegas da redação, certo?
A maior prioridade de um editor da Jump era descobrir como ganhar popularidade nas pesquisas de leitores enviadas a cada semana. Se você não conseguisse se tornar popular o suficiente, tanto a seção de sua responsabilidade quanto o trabalho de seu artista de mangá poderiam estar em risco. Mas todos estavam lutando para conseguir um pedaço da mesma torta, então parecia que todos estavam cuidando de si mesmos e de mais ninguém, e os relacionamentos muitas vezes pareciam tensos entre os colegas do departamento editorial. Alguns poderiam chamar de rivalidades amigáveis, mas esse não era realmente o caso.
Como você descreveria seu relacionamento com colegas editores?
A Weekly Shonen Jump possui um sistema onde os editores são divididos em grupos de três ou quatro, e eles têm cerca de quatro semanas para criar conteúdo para as outras páginas da revista, além da série de mangás serializada. O vínculo dentro de cada grupo era levado muito a sério e havia uma tendência de os membros saírem para almoçar juntos todos os dias, assim como para beber. Durante essas saídas, todos fofocavam sobre os outros grupos, o que eu achava desagradável, mas não havia nada que eu pudesse fazer a respeito. Todos fazíamos parte do mesmo departamento editorial, mas havia a sensação de que, se você se aproximasse de um colega de trabalho fora do grupo, os membros do seu próprio grupo iriam tratá-lo com indiferença.
E havia uma divisão completa entre as seções, é isso?
Os relacionamentos dentro da empresa nem mesmo se estendiam a todo o departamento editorial, e a maior parte do nosso trabalho foi concluído apenas com os membros do nosso próprio grupo. Além disso, dentro do departamento editorial da Jump, sem falar em contratar recrutas em meio de carreira, era raro haver transferências de outros departamentos. Basicamente, quando os recém-formados chegavam, após serem designados como membros da equipe, eles sempre estariam nos mesmos grupos. Apesar de fazermos parte da mesma empresa, não tínhamos ideia do que estava acontecendo na redação das outras revistas.
Parece que deve ter sido um ambiente bastante dividido.
E por isso me esforcei para não me associar a outras pessoas da redação (risos). Eu estava encarregado da série Dr. Slump, de Akira Toriyama, e na época em que começou a se tornar um sucesso, ouvi da Monthly Playboy (também publicada pela Shueisha) que eles queriam fazer uma cobertura da série. O nome do autor do artigo era Akira Sakuma, que mais tarde lançaria Momotarou Dentetsu (uma série de videogames que começou a ser lançado no Japão em 1988).
Eu me tornei próximo do Sakuma-san e, por meio dessa conexão, conheci o Yuuji Horii de Dragon Quest; foi assim que ativamente recrutei autores externos para trabalhar na revista. Assim, coisas como a seção de envio do leitor chamada “Jump Broadcasting Office” e a “Famicom Shinken”, que apresentava artigos introdutórios para videogames, foram criados. No início, enfrentei a reação de meus colegas por usar pessoas de fora da organização. Eles disseram: “Você não pode fazer isso; os resultados da nossa pesquisa vazarão. ”
No final, só conseguimos concluir esses projetos com a condição de que trabalhassem em uma sala de conferências e nunca tivessem posto os pés na redação. As vozes discordantes morreram depois que esses segmentos começaram a ter alta classificação nas pesquisas, mas ainda ouvi pessoas falando pelas minhas costas, dizendo que eu estava desperdiçando energia ao me concentrar em coisas além de mangás, e que nossos esforços eram triviais.
Depois disso, você deixou temporariamente a Jump para lançar a revista de jogos chamada V-Jump, em 1993.
Se eu não tivesse construído essas conexões com pessoas de fora da empresa, provavelmente não teria sido capaz de lançar o V-Jump. Mas meu título como editor-chefe fundador foi de apenas três anos. Com o número cada vez menor de circulação, fui chamado de volta para reformular a Weekly Shonen Jump, em 1996, como seu editor-chefe. O motivo era que eles queriam que Akira Toriyama continuasse com uma nova série, após o fim de Dragon Ball. A linha de pensamento da administração na época parecia ser que uma nova série do Toriyama faria com que a Jump recuperasse suas vendas perdidas. Mas eu sabia que seria difícil. Ele havia chegado a um ponto em que penou apenas para passar por Dragon Ball, e não seria capaz de desenhar uma nova série.
Quando você se tornou o editor-chefe da Jump, qual foi sua primeira ordem de negócios?
Eu sabia que os dias de circulação de 6.530.000 cópias já haviam passado. Eu estava confiante, desde o momento em que criei o V-Jump, que viria uma era em que mangás, jogos e animes poderiam ser acessados de um único lugar, como pode ser visto com os computadores e smartphones que temos hoje. Desde o início, tive minhas dúvidas sobre se havia realmente algum significado em aumentar o número de circulações. A circulação não é a única forma de obter receita; também há vendas de volume encadernados e lucros de adaptações de anime, então eu imaginei que a soma total deveria ser o que determinaria nosso sucesso. Com sucessos como Yu-Gi-Oh!, o lucro total atingiu recordes.
Como você mudou o ambiente no departamento editorial?
Naturalmente, tive a tendência de deixar o clima lá mais descontraído. Em primeiro lugar, eu queria adotar aquela abordagem de escola para meninos que a Jump tinha anteriormente, somar as mentalidades de fazendeiros e caçadores, dividir essas características igualmente entre todos e criar um sentimento mais livre. Eu mudei para que pessoas de fora pudessem ir e vir livremente, e os novatos não precisassem mais se sentir pressionados a aceitar convites para sair para beber. Eu instiguei uma forte consciência da necessidade de permitir que os funcionários mantenham seu trabalho e sua vida privada separados. Como resultado, o ambiente se tornou menos como uma escola só para meninos e mais como uma escola mista. Embora não tivéssemos nenhuma mulher como editor (risos).
Parece que, na segunda metade dos anos 90, títulos que atraíram fãs do sexo feminino, como Houshin Engi e Prince of Tennis, se tornaram mais abundantes.
De certa forma, essa sensação de se tornar mais misto pode ter afetado todo o estilo da Jump. Mesmo que o mantra tradicional de amizade, esforço e vitória começasse a desaparecer, a ideia de que as pesquisas reinavam supremas permaneceu. Na década de 90, cerca de 30.000 cartões-postais de pesquisa chegavam todas as semanas. O mais cedo em que começamos a recebê-los foi nas noites de terça-feira, quando chegariam cerca de 300. Esses primeiros relatórios foram, na verdade, fontes de informação incrivelmente valiosas. Nas noites de terça-feira, ainda havia tempo suficiente para aplicar as mudanças aos manuscritos em andamento para a próxima edição. Hoje em dia, com a Internet, e especialmente as plataformas de mídia social como o Twitter, podemos facilmente reunir as opiniões dos leitores, mas talvez a Jump fosse a única revista capaz de ter a sensação de que seu conteúdo estava vivo naquela época.
Em outras palavras, as pesquisas sustentaram a Jump em sua Era de Ouro.
Criar conteúdo com base na interação com os leitores, pode ser a maior força que o Jump teve, desde seu início. Pode ser a única revista em que até crianças podem participar e ter suas vozes fazendo a diferença. As pesquisas não são a única fonte de informação com que contamos. Outra referência útil vem do departamento editorial ser aberto ao público. Os professores vêm com dezenas de alunos, com tanta frequência, que é como se estivéssemos organizando uma excursão. Os membros mais jovens da equipe irão mostrar a eles e explicar como as coisas funcionam, mostrando-lhes manuscritos e tal, mas também fazem perguntas como: “do que você tem gostado ultimamente?”, e até mesmo lhes dizem: “nós temos mercadorias, então vá em frente e escolham o que quiserem”. Ver como eles reagem é outra referência que podemos usar.
O evento de interação com os fãs, conhecido como “Jump Festa”, é algo que começou durante o seu tempo como editor-chefe, certo?
A “Jump Festa” ocorre a cada Dezembro e dura dois dias, e os leitores são convidados a participar gratuitamente, portanto, a cada ano há mais de 100.000 participantes. Nosso principal objetivo é transmitir nossa gratidão aos fãs por seu apoio naquele ano, mas mesmo assim estamos observando os rostos dos leitores, observando suas reações e usando isso como feedback para a revista. O próprio evento partiu de uma sugestão e já dura quase 20 anos. Isso poderia ser chamado de uma nova força para que a Jump siga em frente.
Entrevista por: Tarou Kawashima
Entrevista com Kazuhiko Torishima no ITmedia Business ONLINE (26 de outubro de 2018)
Agora, não apenas no Japão, mas também em mercados estrangeiros, Akira Toriyama é listado como um dos “japoneses mais famosos do mundo”. O Toriyama-sensei foi descoberto pelo ex-editor-chefe da Weekly Shonen Jump, Kazuhiko Torishima, que comemora seu 50º aniversário em 2018.
Torishima-san também aparece em “Dr. Slump” como o personagem “Dr. Mashirito”.
Torishima-san é conhecido como um “editor lendário” no mundo dos mangás, tendo levado o Yuji Horii-san do RPG “Dragon Quest” para o mundo dos jogos como escritor. Como ele conseguiu alcançar resultados sem precedentes, apesar de ter sido designado para um trabalho que não queria fazer? Perguntamos a ele sobre seu tempo como novo funcionário.
PARTE 01:
Torishima-san, dizem que você é “o melhor editor de mangás do Japão”, mas por que você decidiu se tornar um editor quando era estudante?
Quando eu estava procurando um emprego, queria muito saber qual era minha verdadeira aptidão, então fiz uma lista de coisas em que achava que era melhor do que os outros. E enquanto me perguntava se era realmente bom, apaguei um por um. Como resultado, apenas um permaneceu. “Eu leio mais livros do que outras pessoas” era a única coisa que restou. Também aprendi que ninguém é melhor que ninguém.
Então, se você fizesse disso uma profissão, seria autor ou editor? Mas quando tentei ser autor, descobri que era fatalmente falho. Se você é um artista, por exemplo, ter uma ideia e continuar aprofundando essa ideia seria o tema do seu desenho, mas eu não poderia fazer isso. Eu esqueço quando acordo no dia seguinte (risos). Quando penso: “Espero que o tempo esteja bom hoje”, esqueço as coisas ruins que aconteceram ontem. Eu achava que essa personalidade não era adequada para autores, então não tive escolha a não ser me tornar um editor.
Foi um processo de eliminação!
Então você simplesmente aceitou ser editor?
Não, não é tão simples! Entrar em uma editora nunca foi fácil. Na época da minha entrevista de emprego, era o ano seguinte à crise do petróleo e foi muito difícil conseguir um emprego. A maioria dos fabricantes parou de usá-los. A Bungeishunjusha (文藝春秋社), para onde eu mais queria ir, também cancelou os recrutamentos. Empresas de publicidade e emissoras de televisão também estavam fechadas. Como resultado, fui em 48 empresas e apenas 2 me aceitaram. Uma companhia de seguros de vida e a Shueisha.
Entrei na Shueisha apenas dizendo em uma entrevista que queria me envolver na Monthly Playboy Japan. A “Playboy” foi publicada pela primeira vez um ano antes de eu prestar vestibular, e o conteúdo, incluindo a estratégia publicitária, era muito interessante. Senti que finalmente tínhamos lançado uma revista geral que pega nitidamente as pessoas na faixa dos 20 e 30 anos, em vez das antiquadas.
No entanto, você realmente foi designado ao mangá. Como foi recebido?
Eu estava confuso no início, porque não havia lido nenhum quadrinho antes. Eu nem sabia da existência da “Weekly Shonen Jump” (risos). Meu chefe me disse para ler os números anteriores, então os li, mas nenhum deles era interessante. As imagens eram sujas, e os temas desenhados eram todos chatos, como: “Os homens deveriam fazer algo sobre isso”… O que é esse sentimento antiquado? Pensei.
Não achei nada interessante, então comecei a pensar em mudar de emprego uma semana depois de ser designado. Todos os dias, eu olhava os anúncios de emprego no jornal. Sabia que não estaria em desvantagem em mudar de emprego até completar 28 anos (risos).
Mas você queria trabalhar lá?
Isso mesmo. Na verdade, eu não gostava do departamento editorial na época, em parte porque não havia muitas pessoas que eu achava interessantes. É por isso que eu sempre terminava meu trabalho rapidamente, dizia: “Vou fazer uma pesquisa” e tirava uma soneca na sala de referência da Shogakukan. Comparativamente, eu trabalhava bem rápido.
Um dia, quando olhei ao redor na sala de referência, havia revistas de mangá além da Jump, então tentei lê-las e achei que havia alguns mangás interessantes. “Kaze to Ki no Uta” de Keiko Takemiya e “Poe no Ichizoku” de Moto Hagio. O mangá tem muitas técnicas e variações, e achei surpreendentemente interessante. No entanto, senti que, em especial, “só existem mangás com uma forma tendenciosa na Jump”.
Forma tendenciosa?
Sim! É por isso que eu realmente pensei: “Só as coisas que eu não gosto estão na Shonen Jump” (risos). Mas graças a ler muitos mangás na sala de referência, tive a sorte de descobrir que existem muitas formas diferentes de mangás e que existem alguns que acho interessantes.
Foi difícil encontrar algo interessante em um campo em que você não era bom ou não gostava? Creio que há leitores na faixa dos 20 e 30 anos que pensam que seu trabalho atual é chato e que realmente não querem fazê-lo. O que acha?
De fato! Eu sei como você se sente porque eu estava em uma situação semelhante. Vamos falar sobre a inventividade quando eu era um novo funcionário. Logo depois de ingressar na empresa, fui encarregado do mangá “Doberman Deka”. É impensável agora, mas quando alguém no comando entra, você geralmente lê as edições anteriores desse mangá, certo? “Mas eu não lia.” Mais do que “não ler”, eu não conseguia ler porque era chato. Não gostei do visual e nem do tema. Quando li o primeiro capítulo, pensei “não aguento mais” e joguei fora… (risos).
Shinji Hiramatsu, que tinha cerca de 20 anos na época, era o mangaká de Doberman Deka, e ele tinha uma personalidade muito boa. Mas quando participava de uma reunião com seu editor antecessor, ele só dizia “hã” ou “sim”.
Os editores apenas dizem as coisas unilateralmente, e os autores apenas dizem “hã” ou “sim”. Eu não gostava disso. Na verdade, levei três meses para descobrir como chegar ao ponto em que pudéssemos simplesmente conversar.
Ele era um jovem do interior que tinha muita energia. Por isso tentei encontrar um vídeo sexy, trazer um novo trabalho para ele e usá-los como material para conversarmos. Funcionou muito bem (risos).
Quer dizer que, em vez de mangá, você estava trabalhando em “como se comunicar com as pessoas”?
Isso mesmo. Em primeiro lugar, se o lado editorial não souber o que o redator está pensando, a reunião em si não funcionará. Dessa forma, depois de três meses, finalmente consegui conversar com o Hiramatsu-sensei.
Bem naquela época, o Buronson-sensei, o roteirista de Doberman Deka, surgiu com o trabalho original para o capítulo em que uma nova policial feminina aparece. Com base nisso, surgiu o manuscrito do mangá, mas era diferente da imagem que eu tinha. A policial feminina que ele desenhou era bonita e com um rosto fino, mas eu pensava em uma imagem mais jovem e fofa, então não tive coragem de enviá-la.
Então, me arrisquei e liguei para Hiramatsu-san e disse pela primeira vez: “Quero que você mude a personagem porque é diferente da imagem que idealizo”. Imediatamente fui ver o Hiramatsu-sensei com a revista “Myojo” e expliquei que queria criar esse tipo de imagem mostrando a fotogravura de Ikue Sakakibara, que ainda não era mundialmente reconhecida naquela época. Com base no rosto de Sakakibara, pedi para o Hiramatsu desenhar repetidamente a personagem. Então, com isso, consegui fazer com que ele transformasse aquela personagem.
Naquele dia, Hiramatsu-sensei ficou acordado a noite toda e redesenhou todos os rostos. Como resultado, “Doberman Deka”, que não havia ficado nem em 10º na pesquisa de leitores até o momento, subiu repentinamente para o 3º lugar. Quando contei ao Buronson, o roteirista do trabalho, sobre como isso aconteceu, eles abandonaram a obra original e fizeram uma sequência com a nova personagem como principal. Como resultado, ganhou o primeiro lugar em uma pesquisa de leitores. Naquela época, senti pela primeira vez que “trabalhar com mangás pode ser interessante”.
Na época em que eu estava no comando, Doberman Deka não era popular. Soube mais tarde que o departamento editorial estava planejando descontinuar a serialização depois de três meses. Naquela época, eu não estava sendo valorizado pelo departamento editorial, então posso ter sido forçado a isso (risos).
Você realmente não era valorizado pelo departamento editorial? “Pensando agora nisso, não consigo nem imaginar…”
Eu não gostava dos mangás da Shonen Jump, e deixei isso claro para o departamento editorial. Não há como um novo funcionário como esse ser apreciado (risos). No entanto, devido à minha personalidade, não posso chamar algo que não seja interessante de “interessante”. Mas este incidente me fez perceber que “ser editor de mangás pode ser interessante dependendo de como você faz isso” e “eu devo ser capaz de criar um mangá interessante e ficar em primeiro lugar em uma pesquisa.” Se você obtiver resultados, ninguém poderá reclamar. Tornou-se minha motivação para trabalhar.
Você descobriu sua própria metodologia. Como era o clima no departamento editorial naquela época?
Na época, todo mundo era da Universidade Waseda, e eu sofria bullying só porque era da Universidade Keio. Ainda me lembro que o vice-editor-chefe da época me convidou para um drinque. Em um bar em Shinjuku, me disseram para cantar uma paródia da música da escola da Universidade Keio, mas eu disse: “Não gosto disso”, e saí na hora. Depois disso, mesmo que ele me convidasse para um drinque, eu dizia: “Com licença, tenho um compromisso”. Eu pensava que era algo bobo.
Odeio o clima de espírito esportivo e a maneira como as pessoas se comunicam de uma maneira que as faz parecer estúpidas. A mesma coisa aconteceu quando eu estava no segundo ano do ensino médio.
Eu estava no clube de música, mas quando vi os alunos arrogantes do terceiro ano, falei com meus colegas de classe: “Quando estivermos no terceiro ano, vamos parar com relacionamentos hierárquicos desnecessários”. No entanto, no momento em que aquele colega chegou ao terceiro ano e se tornou diretor, ele começou a fazer a mesma coisa. Então, quando eu o adverti: “Não é o que você prometeu”, ele inventou desculpas sobre “tradição”, então eu disse: “Desculpe, mas não posso trabalhar com você, então estou saindo”, e deixei o clube.
Você realmente desistiu?
Sim! Porque não quero perder meu tempo com essas bobagens.
Mesmo no Japão atual, essas relações hierárquicas desnecessárias e uma sociedade estruturada verticalmente parecem prevalecer. Torishima-san, como você enxerga esse tipo de relação humana rígida?
Pode ser uma maneira desagradável de dizer isso, mas a pessoa que eu mais amo sou eu mesmo. Sinto muito, mas raramente conheci alguém que acho que é mais inteligente do que eu. É por isso que, mesmo ao ouvir as histórias das pessoas, não há o que se fazer (risos). Portanto, é sempre melhor você pensar por si mesmo e fazer na tentativa e erro.
Empresários e leitores também deveriam ter essa mentalidade?
Bem, eu não sei (risos). Eu só vivi dessa maneira, e se eu recomendaria ou não a outros é uma outra questão. Porque cada pessoa tem um caráter diferente. No entanto, muitas vezes pergunto aos novos funcionários: “Por que você acha que existem tantas cores de giz de cera e tintas?” Por que faço isso? “Se houver poucas cores, as imagens que podem ser desenhadas são limitadas.” Existem muitas cores para que várias imagens possam ser desenhadas. Assim, você não precisa se limitar a apenas uma cor.
No entanto, no mundo empresarial de hoje, quanto maior a empresa se torna, mais uniforme ela fica, e tenho a impressão de que a individualidade não está sendo respeitada.
Acho que é porque a educação escolar japonesa como um todo não enfatiza a individualidade. Por exemplo, a primeira coisa que você aprende no Japão é “aprenda com o anterior”. Isso faz parte da educação militar, o que significa seguir o precedente e permitir que o professor controle o grupo como quiser.
Por outro lado, no exterior, as aulas começam com uma apresentação que diz: “Traga algo que você gosta de casa e explique a todos por que você gosta”. Há um mundo de diferença entre a forma de educação que ensina aos outros o que se gosta e a forma de educação baseada na ideia de “aprenda com o anterior”.
O trabalho de um editor tem muitos elementos de apresentação e pode ser semelhante ao que a educação no exterior visa.
Acho que o trabalho de um editor é “pensar é um planejamento” e “conversar é um projeto”. É por isso que pensar e agir no trabalho nunca é realmente um “grande negócio”. Por pensarem excessivamente nisso como um “trabalho”, suas idéias se tornam rígidas e eles são incapazes de fazer muitas coisas. Falei sobre isso no exemplo do “Doberman Deka”, que conseguiu o primeiro lugar ao dar ao artista uma ideia e fazer com que ele realmente a concretizasse.
Tudo que você precisa é de um pensamento ou ideia. Por isso, olhando em retrospecto, os três meses de interação com vídeos sexy se tornaram a base para conversar com ele. O mangá em si é importante, mas também é importante quanto interesse você pode ter nas pessoas. Em última análise, o mangá também muda dependendo do autor, ou seja, “quem o desenha”.
PARTE 02:
COMO O LENDÁRIO EDITOR-CHEFE DA “JUMP” CRIOU “DRAGON BALL”
29 de outubro de 2018
Nesta segunda parte, vamos explorar os bastidores de como Torishima-san descobriu Akira Toriyama, que viria a criar uma sucessão de obras-primas, e como ele fez de “Dr. Slump” e “Dragon Ball” grandes sucessos.
Como você conheceu Akira Toriyama?
Eu o escolhi entre tantos autores. Na época, havia três maneiras de os editores conhecerem autores, novos talentos. Um método era pesquisar entre os assistentes do cartunista. A segunda é trazerem o manuscrito. Havia também autores que circulavam pelas editoras com seus manuscritos completos. Hirohiko Araki, o autor de JoJo’s Bizarre Adventure, também era desse tipo. E o terceiro é o “envio de um artista de mangá”, no qual encontrei Toriyama.
Toriyama era uma pessoa que não conseguia acordar cedo. Então ele também deixou empresa em que trabalhava. Ainda assim, ele só sabia desenhar, então pensei que ele tinha que se tornar um ilustrador ou um cartunista. Se ele estivesse em Tóquio, poderia ter mais opções, mas na época em que Toriyama estava em Nagoya, ele nem sabia como poderia se tornar um ilustrador.
No entanto, quando estava lendo a “Weekly Shonen Magazine”, que pegou em uma cafeteria, encontrou um artigo sobre o recrutamento de trabalhos para o Newcomer Award e começou a desenhar mangá. No começo, ele queria fazer um mangá de comédia. A razão é que histórias em quadrinhos e mangás cômicos têm o mesmo prêmio em dinheiro, mas o número de páginas é a metade. O mangá cômico tem 15 páginas, o mangá de história tem 31 páginas, e ele pensou que o mangá cômico seria mais fácil (risos).
O fato de que Toriyama-sensei desenhou pela primeira vez um mangá cômico é surpreendente.
Sim. No entanto, embora tivesse terminado o manuscrito, o momento não era adequado porque a revista só oferecia inscrições uma vez a cada seis meses. Por outro lado, a “Jump” na época estava solicitando prêmios para recém-chegados todos os meses, então eu li os manuscritos que foram enviados.
Qual foi sua impressão?
Achei lindo o manuscrito. Claro que achei interessante, mas era um manuscrito que não poderia ganhar um prêmio. Como o conteúdo era uma paródia de “Star Wars”, não era elegível para o prêmio de acordo com as regras (risos). Então não foi selecionado.
Como a relação se desenvolveu após isso?
Enviei imediatamente um telegrama e disse a ele: “Você tem talento, então vamos trabalhar juntos”. O editor-chefe da época gostou imediatamente do storyboard, então eu o coloquei na seção para novatos. Foi um trabalho one-shot chamado Wonder Island. Eu anunciei com total satisfação, mas… Fiquei impressionado com a pesquisa dos leitores (risos).
ARALE NASCEU DE UMA “APOSTA” COM O TORIYAMA-SAN
Tudo começou com uma deficiência, né?
É improvável que as coisas vão bem na primeira vez. É uma história sobre um velho soldado Kamikaze vagando pela Wonder Island e de alguma forma tentando voar de volta para o Japão. A partir daí, passei cerca de um ano e meio me comunicando com o Toriyama, e “Dr. Slump” nasceu.
No último ano e meio, tanto Toriyama quanto eu éramos novatos, então discutimos minuciosamente como poderíamos criar um mangá interessante por tentativa e erro. Mais tarde, Toriyama decidiu serializar “Dr. Slump” e mudou de casa. Quando ele estava arrumando sua bagagem, encontrou um manuscrito que eu havia rejeitado no armário, e quando eu contei, parecia que havia 500 deles. É preciso muito tempo e esforço para se tornar um artista de mangá profissional.
Originalmente, em Dr. Slump, Toriyama queria que o autoproclamado cientista genial, Senbei Norimaki, fosse o personagem principal, e ele gostou do personagem. É por isso que Arale Norimaki, a garota andróide, estava programada para aparecer em apenas um capítulo. No entanto, achei que seria melhor fazer de Arale o personagem principal, então fiz uma “aposta” com o Toriyama.
Desenhe um mangá com uma garota como personagem principal (“Gal Detective Tomato”), e se estiver no top 3 da pesquisa dos leitores, continue como está. Se pegasse 4º lugar ou menos, eu disse: “Pode apagar a Arale com apenas um capítulo.” E o resultado foi 3º lugar.
Ganhei a aposta e Arale se tornou a personagem principal, mas Toriyama também era teimoso, então não mudou o título “Dr. Slump”, que representa Senbei Norimaki. No anime de TV, foi intitulado “Dr. Slump – Arale-chan”.
Torishima-san disse anteriormente em entrevistas à mídia que os autores podem ser divididos em dois tipos: “autores rápidos” e “autores lentos”. Como exatamente eles se diferem
Autores que demoram a criar deixam todos infelizes, incluindo as pessoas ao seu redor. Autores estão encurralados, editores envolvidos não podem namorar, serviços familiares não podem ser feitos. As impressoras também terão que esperar. Na produção de revistas, não temos escolha a não ser mudar os layouts que mostram qual conteúdo deve ser colocado em qual página.
No final, é o “se você pode ou não desistir” que decide se o manuscrito é rápido ou lento. Se for uma revista semanal, mesmo que seja interessante, é uma semana, e mesmo que seja chato, é uma semana. É por isso que é tão importante decidir onde, né? Quão rápido um autor pode desenhar um storyboard. Se você persistir em tentar torná-lo interessante, você ultrapassará o período de uma semana.
No entanto, se os leitores acharem o capítulo da semana chato, eles o ignorarão, mas se o da próxima semana for interessante, eles o lerão. Por exemplo, mesmo na Jump (quando você abre o índice da revista), você se lembra de toda vez que havia algo de interessante naquela edição?
Na pesquisa de leitores, escolhemos três quadrinhos interessantes, mas não lemos todos os quadrinhos e damos pontos para avaliá-los de forma justa. Você escolhe três coisas que você gosta ou que deixaram uma impressão em você. É por isso que mesmo que a história não seja ótima, desde que haja pelo menos 15 a 19 páginas de quadrinhos que chamem a atenção, eles continuarão lendo. Tudo o que você precisa fazer é manter uma imagem corretamente atraente.
“Nós não damos pontuação depois de ler todo o mangá, então enquanto houver um quadro que chame sua atenção, eles continuarão lendo.”
Certamente, não há crianças que leem todos os quadrinhos.
Como eu disse na Parte 1, quando eu era um funcionário novato, li vários mangás na sala de referência da Shogakukan. Li mangás de 19 páginas mais de 50 vezes enquanto analisava por que esse painel estava lá e por que estava nesse ângulo. Como resultado, aprendi que existem dois tipos de mangá. Quadrinhos fáceis de ler e quadrinhos difíceis de ler.
Mangá que é difícil de ler vai travar suas mãos. Por outro lado, achei o trabalho de Tetsuya Chiba fácil de ler. O que eu senti profundamente foi que “o mangá é feito de quadros”. A divisão de quadros é a gramática do mangá. Quando ensinei essa metodologia para artistas de mangá recém-chegados, incluindo o Toriyama, seu mangá melhorou constantemente. Foi só depois que me tornei capaz de explicar a gramática do mangá que pude ter reuniões apropriadas sobre mangá, não apenas minhas impressões.
Costumo dizer aos editores novatos: “Alunos do ensino fundamental são mais confiáveis em dizer se está interessante ou não.” Não é o trabalho de um editor, a menos que você analise e treine para descobrir por que é chato, como torná-lo interessante e onde está o “poder do mangá” do autor.
AUTORES NÃO SÃO AMIGOS
Acho que é preciso muita paciência para criar um trabalho com um artista de mangá, mas o que você estava tentando fazer? Também sou editor, mas sempre acho difícil fazer críticas.
Eu entendo como você se sente, mas se fugir de dar sua opinião ao autor, o trabalho vai acabar. É por isso que você pode estar nervoso, mas precisa transmitir até as coisas que são difíceis de dizer.
Artistas de mangá se tornam trabalhadores de meio período se não puderem continuar sua serialização. Não vão ganhar dinheiro. É por isso que os editores precisam dar aos autores a capacidade de desenhar quadrinhos interessantes e aperfeiçoá-los para que possam ser entregues aos leitores. Eles não são amigos. Você não precisa ser querido por eles.
Qual é a diferença entre um artista de mangá que cresce e um que não cresce?
Ouça a avaliação e veja se pode ser “consertado” ou não. Me pergunto se você pode me ouvir honestamente. A clareza é necessária para que o leitor entenda. Como eu disse anteriormente, se não for um “mangá fácil de ler”, minhas mãos vão parar. Os balões de fala no mangá têm cerca de 7 caracteres x 3 linhas e são trocados. A conversa é desenvolvida com as imagens, de modo que o leitor “vê” ao invés de ler. Portanto, deve ser algo que possa ser lido a uma velocidade razoável.
Torishima-san me disse: “Você não precisa ser apreciado pelo autor.”
O “PONTO DE VIRADA” DO DECLÍNIO DA POPULARIDADE DE DRAGON BALL
Qual foi o “ponto de virada” em Dragon Ball?
Em certo ponto, houve um fenômeno em que a classificação da pesquisa de leitores estava caindo constantemente. Depois de conversar com Toriyama e analisar o porquê, chegamos à conclusão de que “Goku não tem apelo como personagem”. O que aprendi com as discussões com o Toriyama foi que Goku é um personagem que quer se tornar mais forte. Então, para fazer esse personagem se destacar, decidi jogar fora todos os personagens, exceto seu professor Mestre Kame e seu companheiro de treinamento Kuririn.
Ao restringi-lo apenas a essas três pessoas e incentivá-las a treinar juntas, o tema da obra foi esclarecido. No entanto, se o período de treinamento for muito longo, as crianças podem ficar entediadas, então montamos um palco chamado “Tenkaichi Budokai”. Ele treinou com o objetivo de alcançar o torneio, e quando ele mostrou o quão forte Goku se tornou, sua popularidade disparou.
É necessário voltar ao ponto de partida em algum momento da criação das obras.
O MEDO DE “JOGAR FORA EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO”
Quais dificuldades você enfrentou depois disso?
Para dizer a verdade, Toriyama disse uma vez: “Quero parar a serialização”. Naquela época, Goku tinha cerca de três cabeças de altura, mas se não tornasse o personagem maior, ele disse: “Eu não posso desenhar mais”.
Cenas de batalha intensas começaram a aparecer no mangá, e foi dito que a ação não poderia ser desenhada com um corpo de três cabeças. Então, quando estava no meio da batalha, estava desenhando com a cabeça levemente esticada, mas então ele disse: “Estou no meu limite”. Se quisesse retratar as batalhas futuras, teria que levantar a cabeça, adicionar músculos e tornar os personagens mais maduros.
No entanto, eu discordava fortemente disso (risos). Montamos o Torneio de Artes Marciais e finalmente estabelecemos o personagem entre os leitores, mas agora querem jogar esse personagem fora. Eu estava perdido e consultei o editor-chefe. Lembro-me de estar muito assustado na data de lançamento da “Jump”, onde foi publicado o capítulo em que a cabeça e o corpo de Goku mudaram.
Até mesmo Torishima-san estava com medo de “jogar fora a experiência de sucesso”
Era assustador ter que jogar fora o que eu havia acumulado. Mesmo se tentarmos coisas novas quando a situação não for boa, queremos ao máximo não tentar coisas quando as coisas estiverem indo bem. Como resultado, relembrando agora, mudar foi a decisão certa.
O SIGNIFICADO DE SE ENVOLVER COM “PESSOAS FORA DA EMPRESA”
Você obteve muito sucesso usando autores externos como o Yuji Horii-san de “Dragon Quest”. Por que ele se associou ativamente com pessoas de fora da empresa?
Originalmente, eu odiava me associar com pessoas na empresa. Usar as despesas da entrevista, comer com as pessoas da empresa e fofocar sobre as relações humanas na empresa. É chato comer com pessoas que se vêem o tempo todo. Eu sempre quis falar com pessoas de fora da empresa. Então todos os tipos de histórias saem. Eu odeio ficar entediado.
Na época em que “Dr. Slump” era popular, falava-se em publicar um artigo de entrevista com o Toriyama na “Weekly Playboy”. Era uma história de Akira Sakuma, que era autor de “Seventeen” na época (mais tarde diretor da série “Momotaro Densetsu”). Enquanto eu fazia isso, o editor-chefe adjunto na época me pediu para ser responsável pela página de envio dos leitores. Como o novo funcionário estava encarregado do envio do leitor, recusei, dizendo: “Não quero fazer isso”.
Que tipo de condições você estabeleceu?
A condição é que eu queria que o Sakuma-san ficasse no comando da página, deixando a produção de edição com a qual eu me relacionava até então. Isso foi realizado para a “Jump Broadcasting Station”. O que costumava ser 4 páginas foi reduzido para 8 páginas, e o ilustrador Takayuki Doi (mais tarde trabalhou em “A Lenda de Momotaro”) foi nomeado para tornar as ilustrações mais atraentes. O conceito era: “Mesmo que você não possa desenhar um mangá, pode escrever um cartão postal e ele será publicado na Jump”.
A história era colocar uma zoação em algo que se tornou um tema quente no mangá e na TV. As crianças também podem participar disso. “Jump Broadcasting Station” de repente ficou em 10º lugar na pesquisa de leitores e ultrapassou metade do mangá.
No entanto, eu achava que o departamento editorial naquela época era “pequeno” porque seria um problema se informações como questionários vazassem, então meus colegas e funcionários mais jovens disseram: “Não coloque pessoas de fora como Sakuma no departamento editorial”. É isso. No final, alugamos uma sala de conferências, onde peguei os cartões-postais dos leitores e trabalhei neles. Naquela época, eu pensei: “É bobagem.”
Em outras palavras, o que estou tentando dizer é que se você trabalha apenas em um espaço pequeno, o mundo que você vê se torna “o mundo inteiro”. Porque não há ar externo.
VOCÊ TEM PODER DE IMAGINAÇÃO?
Torishima-san conseguiu trabalhar sem ser constrangido pela lógica da empresa. Qual era a sua diferença para os outros funcionários?
Pra começar, não gosto de mangá, então eu acho que é porque eu pensei que era tudo mentira, mesmo que me dissessem que “a Jump é incrível”, “Mangá é incrível” e “É incrível que tenha vendido dezenas de milhares de cópias”. Os quadrinhos são tão bons assim? Errado. Não é que o mangá seja incrível, mas que não existem outras mídias que as crianças apoiem, então estou lendo mangá por processo de eliminação. E em primeiro lugar, não é o editor que desenha o mangá, mas o artista do mangá.
Então, não é que a revista seja ótima ou o editor seja incrível. Se pensar sobre isso, verá que é um pensamento razoável. É estúpido dizer coisas assim. E só não tenho (poder de) imaginação suficiente.
Pra começar, não entrei na empresa porque queria fazer mangá. É por isso que pensei que teria “sorte” se pudesse dizer o que queria dizer e me livrar da edição do mangá.
Talvez seja por isso que você diz tudo o que quer dizer.
É o capitalismo, então tudo que você tem a fazer é colocar em números. O topo do departamento editorial pode ser o editor-chefe, mas o papel principal é do editor responsável pelo trabalho de sucesso. Porque eu tenho um autor. Mesmo que o editor-chefe sofra um acidente ou seja transferido temporariamente, a revista ainda pode ser publicada. Mas se não há autores, não podemos publicar revistas. As pessoas que produzem resultados na vanguarda são as mais preciosas.
PARTE 03:
GERENTES QUE DIZEM: “ESSES JOVENS DE HOJE” NÃO ESTÃO TRABALHANDO – A TEORIA ORGANIZACIONAL DO LENDÁRIO EDITOR-CHEFE DA “JUMP”
30 de outubro de 2018
Nessa terceira parte, perguntamos ao Torishima-san como ele vê o estado atual das revistas de mangá e como vem treinando os funcionários enquanto presidente da Hakusensha.
Torishima-san, como você enxerga o estado atual das revistas de mangá?
Mangás não estão mais vendendo! Por que não estão? Claro, a taxa de natalidade em declínio e a digitalização também são alguns dos motivos, mas acho que o principal motivo é que “mangá é maçante”.
O bom do mangá é o “sentimento ao vivo” de poder mudar o conteúdo enquanto observa as reações e reverbarações dos leitores. No entanto, acho que as revistas em quadrinhos de hoje não têm esse “sentimento ao vivo”.
A alma da revista é a miscelânea de “misturas”. Uma das melhores coisas do mangá é que você pode descobrir e nutrir vários talentos e personalidades. Acredito que o papel que o mangá deve desempenhar é que os autores peguem a “atmosfera dos tempos” e que os editores o apresentem aos leitores em um formato fácil de entender.
Entendo! No entanto, agora que nos tornamos uma sociedade da internet, e redes sociais como o Twitter se desenvolveram, sinto que, mais do que nunca, se tornou possível ouvir as vozes dos leitores em tempo real.
Você é um adulto que usa o Twitter, né? Eu não acho que as crianças estão usando o Twitter. Revistas de mangá para crianças, como a “Shonen Jump”, estão caindo em circulação, mas há uma revista que quase não caiu em circulação: A CoroCoro Comic da Shogakukan.
Por que não diminuiu o número de cópias? Acho que é porque almejam crianças de 6 a 11 anos e não alteram o conteúdo. Essa geração não tem celular, então eles não são afetados pelas Redes Sociais. A razão pela qual “Yokai Watch” se tornou um sucesso é porque atraiu a geração de 6 a 11 anos.
Se você acredita no que o criador acha interessante e continua fazendo isso sem vacilar, terá sucesso. Ao adaptá-lo às tendências à nossa frente, podemos criar algo que ressoa emocionalmente jamais visto. Eu disse anteriormente que mudaria o conteúdo com base na reação do leitor, mas isso não é apenas “analisar a pesquisa dos leitores”.
A pesquisa é apenas um reflexo da situação atual. O que você acha que pode fazer se analisar o que tem agora e fizer um mangá? “Será uma cópia.” Mesmo que você analise a situação atual e faça um mangá, só conseguirá produzir uma “cópia”.
Os criadores não têm escolha a não ser buscar os desejos dos leitores com base em questionários atuais e criar obras com base em suas próprias hipóteses de “talvez assim”. Pensando assim, não acho que as revistas de mangá hoje estejam tentando coisas novas. É por isso que não consigo conectar os resultados da resposta com a próxima. Aqueles que podem transmitir “sentimentos ao vivo” se sustentam. Por exemplo, mesmo na indústria da música, os CDs não estão vendendo bem, mas as apresentações ao vivo em festivais de rock ainda são bem-sucedidas.
Como os criadores de conteúdo devem se sentir em relação aos seus leitores e espectadores?
Como nossos leitores estão vivendo? Por exemplo, a que tipo de material você se refere quando faz um novo projeto como editor? “Existem vários tipos de informação, como jornais, TV e revistas.” Mas você já deve ter metade dos dados para tornar esse projeto um sucesso.
Por exemplo, você conhece seu estilo de vida atual, como você gasta seu tempo desde a hora que acorda de manhã até a hora de ir para a cama à noite? Você também deve saber como seu estilo de vida mudou em comparação com quando você era estudante.
Os leitores vivem na mesma época que você. Se você pensar no que está pensando e como está vivendo agora, e como vive como consumidor, metade das informações necessárias para o planejamento estarão preenchidas. O ponto é que você tem que pensar por si mesmo. Se você fugir de pensar nisso só porque é o seu trabalho, estará confiando em materiais de marketing feitos por outra pessoa. Se assim for, será um plano que não tem base em lugar nenhum.
A outra metade deve ser considerada de acordo com atributos como se o alvo é homem ou mulher e qual a idade. Basicamente, você tem que pensar por si mesmo.
Depois de trabalhar como editor, você se tornou diretor administrativo da Shueisha desde 2010 e presidente da Hakusensha desde 2015. Torishima-san, por favor, diga-nos como é a sua gestão.
Toda empresa costuma perguntar: “E os jovens de hoje em dia?” De fato, mesmo em reuniões de diretoria e reuniões executivas de editoras, há declarações de que “os jovens de hoje não consegue crescer”. Por que essas palavras surgem? Acho que há um grande problema aqui.
Há muito se diz que “publicação se trata de pessoas”. É por isso que os editores estão criando métodos para vender enquanto fazem vários esforços para nutrir mangakás. Então, por que não há paixão pelo desenvolvimento dos funcionários?
Porque os funcionários não se importam. Não estão observando-os e não há gestão. Achei isso curioso!
Pra começar, oor que os executivos da empresa estão em primeiro lugar? Para treinar os funcionários. Em outras palavras, dizer que “os jovens não conseguem crescer” equivale a admitir que “não estou trabalhando”.
Existem duas palavras para “ver” em inglês: Look e Watch. Look significa simplesmente “ver”, mas Watch significa “observar”. Que tipo de trabalho os funcionários estão fazendo atualmente, no que estão interessados e quais são suas preocupações? Como está sua saúde?
Os gerentes e executivos da empresa devem observá-los atentamente e proteger seus funcionários. Mas isso não é feito!
Antes de mais nada, é importante entender a situação atual. Depois disso, considere, por exemplo, uma estratégia de recrutamento. Como resultado da comparação do que aconteceu com o novo funcionário, três anos depois, e cinco anos depois, o que fazer com o recrutamento deste ano. É precisar dar feedback e pensar assim, mas não se tem sido capaz de fazê-lo, e isso porque não estão observando direito a situação dos funcionários atuais.
Precisamos mudar esse estilo de gestão!
A primeira coisa que fiz quando vim para Hakusensha foi entrevistar todos os cerca de 100 funcionários. Pedi ao departamento de assuntos gerais que viesse e dissesse que queria entrevistar todos eles. O que senti naquela entrevista foi que “os jovens da área são um pouco sem brilho”. Então, pedi novamente ao departamento de assuntos gerais para pegar pessoas com menos de 40 anos e dividi-las em equipes de quatro, com diferentes idades e ocupações.
A partir das 11h de segunda-feira, cada grupo de quatro terá uma reunião com três conjuntos de sanduíches por duas horas. Eu decidi sobre duas questões. Pedimos que escolhessem entre “Se você se tornar o presidente” ou “Se você se tornar o editor-chefe”, e façam uma apresentação em uma folha de papel A4. Com base nisso, haverá uma discussão com os outros participantes e comigo.
Qual era o seu objetivo?
Eu disse aos jovens: “Há duas razões para fazer isso.” A primeira é aprimorar suas habilidades linguísticas. Nosso trabalho é ouvir as palavras do autor e transmiti-las ao leitor. Palavras são armas, e se você não aprimorar esse poder, não se tornará um negócio. É por isso que aprimoro essa habilidade explicando às pessoas. Quando você explica algo para alguém, você não pode explicar a menos que você mesmo entenda. Além disso, ouvindo as histórias das pessoas, posso entender a diferença entre mim e os outros.
A segunda é criar uma relação cara a cara com vários funcionários. Em uma empresa com 100 pessoas, mesmo que você conheça os rostos de diferentes setores, você não sabe o que a outra pessoa está pensando ou que tipo de trabalho ela está fazendo. No entanto, enquanto você estiver na empresa, seu trabalho não irá bem a menos que você faça bom uso das pessoas de lá. Para que os jovens aumentem seu próprio potencial de luta, eles devem não apenas desenvolver suas próprias habilidades, mas também ter a ideia de como aproveitar ao máximo os outros funcionários.
E eu acho que, de qualquer forma, eu preciso estar sempre conversando. Os japoneses não são bons em bate-papo. Por exemplo, sobre o que você fala nas festas? Falar sobre o tempo e beisebol não é suficiente. Observe a reação da outra pessoa e procure dicas para desenvolver a história. Isso é que é conversar!
Quando começo uma apresentação, começo falando sobre meus sentimentos e pensamentos em um estilo de ensaio. Depois disso, os jovens farão apresentações. Ao conversar, reduzo as barreiras para falar e depois chego ao ponto. É por isso que o objetivo original é continuar conversando em vez de discutir o assunto ou tema. Indo fundo no assunto enquanto fala. Este é um ponto importante e fundamental quando os editores se reúnem com os autores.
Assim como a história sobre a qual falei antes, lutei por três meses para falar com o Shinji Hiramatsu-sensei. Se você puder conversar, metade da reunião já estará concluída. Parece fácil, mas não é. No entanto, se você continuar conversando por 30 minutos, a compatibilidade com essa pessoa não será ruim. Por outro lado, você não deve trabalhar com pessoas que não podem conversar por 30 minutos (risos).
Torishima-san, você já chegou a pensar que não se dava bem com certas pessoas?
Muitas vezes (risos). No entanto, o conselho que sempre dou aos mais jovens que têm esses problemas é amar a pessoa na frente deles. Por exemplo, se você tem uma namorada que ama, pode pensar: “O que ela quer comer agora?” Quando está tossindo, você se pergunta se ela está bem, certo? “Isso é o que os editores devem fazer pelos autores.” Assim, você saberá o que fazer.
Os autores também tentam fazer o melhor, mesmo que lhes digam coisas duras, se acharem que o editor cuidará bem deles. Há pessoas que são gentis, mas sempre retribuem o favor, e pessoas que são rígidas, mas sempre pensam em si mesmas. É bastante óbvio qual é o mais importante. Quando você pensa assim, as coisas são bem simples. Não é nada difícil.
Costuma-se dizer que os editores profissionais não são adequados para cargos de gestão ou administração. Torishima-san, você passou de editor-chefe a presidente, mas a habilidade que cultivou na área se conecta com a habilidade de administrar um negócio?
Acho que está conectado! O que costumo dizer aos meus funcionários é que os cargos não representam habilidades, hierarquia humana ou julgamentos de valor. O presidente é várias vezes melhor que o chefe de seção? Não!
Por exemplo, quando eu estava na escola primária, os títulos de “monitor do almoço” e “responsável pela limpeza” simplesmente definiam um papel. Eu penso sobre qual é o papel que me é dado e tento cumpri-lo. Se cada funcionário pensar assim, a organização funcionará sem problemas.
Há coisas que não são aceitáveis, mas também há coisas boas sobre os trabalhadores de escritório. Ou seja, mesmo que você falhe, poderá abrir novas perspectivas e trabalhar mudando de ocupação e departamento posteriormente.
Pense bem nisso! Mesmo se você começar seu próprio negócio, acho que seria difícil trabalhar com uma grande quantidade de dinheiro. Mas se você for um funcionário de empresa, se conseguir convencer seu chefe a levar o projeto adiante, poderá movimentar muito dinheiro. Você sabe qual é mais interessante, certo? (risos).
Que tipo de perspectivas você tem para sua vida após se aposentar como presidente?
Não sei o que o futuro reserva, mas, se possível, gostaria de me envolver em colocar pessoas talentosas no mundo. Não se limita ao mundo dos mangás. Há muitas pessoas que estão preocupadas. No entanto, apenas ouvindo a pessoa ou mudando um pouco sua perspectiva, você pode mudar completamente a maneira como ela vê as coisas. Gostaria de fazer uso do que cultivei até agora e ser útil em tais assuntos.
Tenho conhecimento e experiência, mas acho que meus sentidos se deterioraram consideravelmente. Eu mesmo estou ciente disso (risos).
Certa vez, ouvi uma história sobre um aluno do ensino fundamental que parou de ir à escola por causa de bullying, mas ganhou coragem para passar pelos portões da escola ao ler “Dragon Ball”, e fiquei profundamente comovido. Torishima-san, você, que esteve envolvido com muitas crianças através da edição de mangás, adoraria que você estivesse envolvido em atividades educacionais também. O que acha?
Hmm. É uma pergunta difícil. Por exemplo, há questões como bullying e abuso infantil, e acredito que essas questões nunca desaparecerão. Animais não humanos atacam outros apenas “para proteger sua existência”. Os humanos são as únicas criaturas que intimidam os outros mesmo quando não estão defendendo sua própria existência. Queria saber o porquê. Acho que é porque os humanos possuem inteligência. É por isso que é problemático!
Os humanos evoluíram para inventar coisas por causa de sua inteligência. No entanto, nem todas as coisas boas vêm de invenções. Alfred Nobel, do “Prêmio Nobel”, inventou a dinamite, tornando-se possível esmagar rochas e criar novas barragens. Por outro lado, a dinamite também pode ser usada na guerra para matar pessoas. Desta forma, as coisas sempre têm dois lados, frente e verso.
É irônico que o bullying aconteça por causa da inteligência.
As crianças são fixadas aos mesmos membros nas relações escolares, portanto, comparadas aos adultos, são extremamente inconvenientes. Se for uma empresa em vez de uma escola, mesmo que haja bullying, você pode mudar de emprego. Você pode fazer uma viagem como uma distração e beber álcool. Mas as crianças não têm capital, então elas sempre “não têm escapatória”. Quando vão para casa, seus pais estão lá. Se você for à escola, seu professor perguntará: “O que há com você?” Sempre tem um conselheiro irritante nas atividades do clube.
Os adultos deveriam saber com o que se preocupavam quando eram crianças, mas em algum momento eles esquecem. É a mesma maneira de pensar ao fazer um planejamento, como mencionei anteriormente. Mas fogem de pensar, então chegam à conclusão de: “Não tem nada a ver comigo”. É uma questão complicada!
Compreendo! Da mesma forma que os adultos esquecem suas preocupações quando crianças, os gerentes podem esquecer o que os preocupava no passado. No entanto, se acha que os problemas de seus subordinados são irrelevantes para você, não será capaz de gerenciá-los.
Como eu disse anteriormente, é trabalho do chefe interessar-se por seus subordinados e alimentá-los. Também acho importante organizar uma equipe para que possamos fazer uso de várias personalidades. Você não precisa tingir seus funcionários em uma só cor.
A equipe é capaz de fazer uso de várias personalidades? É possível aceitar a individualidade de cada pessoa? Acredito que administrar uma empresa exige uma consideração constante disso.
Entrevista com Kazuhiko Torishima no site Nikkei (11 de fevereiro de 2019)
UMA OBRA-PRIMA QUE O LENDÁRIO EDITOR DA JUMP INTERPRETOU MAL
Sobrevivência dos Mangás (1)
Mangá, um estudante de honra do conteúdo de classe mundial do Japão, está enfrentando ventos contrários sem precedentes. A Weekly Shonen Jump, que há muito é líder em revistas de quadrinhos, caiu para um quarto de seu pico, e existem apenas poucas obras de mega-sucesso. No lugar, surgiram aplicativos de mangá para smartphones lançados por empresas estrangeiras e sites piratas como o “Mangamura”. Ondas violentas de globalização e digitalização não são estranhas ao mangá. Quem irá sobreviver? Iremos abordar isso 5 vezes. Primeiro, vamos começar com a história secreta por trás do nascimento de um único mangá deu suporte às crises da Jump.
Sem a nova série que começou em 22 de julho de 1997, a Weekly Shonen Jump, que comemora seu 51º aniversário este ano, poderia ter perdido o fôlego. Ele está na vanguarda do mangá shonen há mais de 20 anos e já vendeu mais de 400 milhões de cópias em todo o mundo. O incrível mangá “One Piece” foi reconhecido pelo Guinness World Records.
Uma Polêmica Reunião de Serialização
Leitores de todas as idades, gêneros e nacionalidades continuam fascinados pelo drama de ação em que um menino que sonha em se tornar um rei pirata embarca em uma aventura bizarra com seus amigos. No entanto, o departamento editorial da Jump não divulgou este trabalho com confiança. Muitas das obras que depois se tornam mega-sucessos passam tranquilamente pela “reunião de serialização”, onde os executivos editoriais discutem antecipadamente se uma nova serialização é possível ou não. One Piece foi diferente.
“A história não é bem organizada, e o personagem principal com seus braços elásticos também não é legal.”
Reunião de 1997. Quando Kazuhiko Torishima (66), que era o editor-chefe na época e presidente da Hakusensha, expressou sua oposição ao início da serialização, muitos imediatamente se opuseram.
“Ele é um protagonista de sangue quente e obstinado que a Jump não tem hoje. Ele é fácil de entender para as crianças e deve ser popular.”
As opiniões dos editores adjuntos que se reuniram na sala de conferências e das mesas, cada um liderando uma equipe de 3 a 4 pessoas, estavam completamente divididas. A reunião, que normalmente termina rapidamente, não previa conclusão mesmo depois de mais de duas horas.
A Indecisão do Lendário Editor
Torishima é conhecido como o “Editor Lendário da Jump”. Depois de ingressar na Shueisha para editar romances para a edição japonesa mensal da Playboy, ele foi designado para o departamento editorial da Jump, o que ele não queria.
Embora nunca tivesse lido mangá antes, ele estudou as obras-primas de Osamu Tezuka e Tetsuya Chiba como materiais de ensino. No terceiro ano, ele descobriu um novato ainda desconhecido, Akira Toriyama, da pilha de manuscritos rejeitados para o Prêmio de Novastos, e fez sucesso com o mangá “Dr. Slump”, que nasceu após mais de 500 manuscritos rejeitados. Apareceu como o vilão Dr. Masirito nessa mesma obra.
Em seguida, o mangá de batalhas “Dragon Ball”, com o qual colaborou com Toriyama, tornou-se um mega-sucesso em escala global, e Toriyama se estabeleceu como a maior autoridade em mangás shounen. Depois disso, Torishima descobriu Masakazu Katsura do mangá de romance “Video Girl Ai” e desempenhou um papel no nascimento do jogo nacional “Dragon Quest”, conectando figuras importantes na indústria de jogos.
Até Torishima estava hesitante em tomar uma decisão sobre One Piece. Já havia se passado quase 3 horas desde que a reunião começara. Quando o sol se pôs, a mesa fez uma reclamação comovente, dizendo: “Se não puder fazer isso, tanto os autores quanto os editores irão se prejudicar”.
Bata no seu superior se ele não conseguir
O plano para a nova serialização é elaborado pelo redator e pelo editor responsável, e somente após receber a aprovação da mesa, é que chega a esta reunião.
O criador de One Piece, Eiichiro Oda, era apenas um dos muitos novos autores da época. O editor responsável também era um jovem da mesma idade, e One Piece já tinha sido rejeitado três vezes na reunião de serialização. Foi nessa reunião que propuseram um plano reformulado com uma estrutura retrógrada.
A editora Hira não pôde comparecer à reunião, então ela não teve escolha a não ser sentar em sua cadeira no departamento editorial no 4º andar da Shueisha e aguardar a conclusão trazida por sua mesa. O editor responsável revelou seus sentimentos na época em um programa de rádio de 2018, dizendo: “Tive um sonho em que batia em todos que estavam participando da reunião, sentindo-me frustrado, machucado e odiado”.
No entanto, naquela época, atrás da porta da sala de conferências fechada, o editor-chefe Torishima se comoveu com as palavras do vice-editor-chefe e da mesa que insistiam em iniciar a serialização.
Aposta Assertiva
“Diferenças de opinião podem significar que pode ser um grande sucesso.”
É natural sentir resistência a coisas novas. E apenas os novos têm potencial para se tornarem não meros hits, mas mega sucessos que se tornam um fenômeno social. Assim como Dragon Ball no passado, que mostrava uma ação emocionante com personagens pop que ninguém nunca tinha visto antes.
A aposta deu certo. One Piece ficou em primeiro lugar na primeira pesquisa. Dessa forma, subiu a rodovia do sucesso a uma velocidade tremenda. No dia em que Torishima soube dos resultados da pesquisa, ele deu um suspiro de alívio pela primeira vez desde que se tornou editor-chefe.
Uma tremenda diminuição no número de cópias
No final de 1994, a Shonen Jump estabeleceu um recorde mundial no Guinness com a circulação de 6,53 milhões de cópias, mas caiu rapidamente depois disso.
“Yu Yu Hakusho”, “Dragon Ball”, “Slam Dunk”… As obras que sustentavam o arcabouço popular terminaram uma após a outra. A circulação caiu para 6,18 milhões de cópias no ano seguinte, e para 4,5 milhões de cópias dois anos depois. Torishima, que era o editor-chefe da nova revista “V-Jump”, foi chamado de volta para reconstruí-la.
Em fevereiro de 1996, aos 43 anos, tornou-se editor-chefe da Jump. A primeira coisa que fez foi matar os menos de 10 novos projetos que herdou do seu antecessor. Mangás baseados em romances de autores populares não era exceção, e os primeiros três meses após se tornar o novo editor-chefe foram gastos fazendo uma peregrinação de desculpas aos envolvidos.
O segredo do “Mangá de Detetive”
Naquela época, Torishima foi convocado ao gabinete do presidente e recebeu uma ordem secreta.
“Faça um mangá de detetive”
Naquela época, a rival Weekly Shonen Magazine era popular com o mangá de mistério “Kindaichi Shonen no Jikenbo” e a Weekly Shonen Sunday tinha “Detetive Conan”. Os executivos da administração possuem um forte senso de crise na situação atual em que as revistas são pressionadas por conta da circulação, e a existência de mangás policiais que não estavam na Jump tornou-se um tema popular.
“Não é tão simples, e é desrespeitoso com Kindaichi e Conan dizer que são populares porque o tema é detetive.” Torishima não teve escolha a não ser aceitar as instruções, mesmo que estivesse desapontado em seu coração. Depois de retornar ao assento do editor-chefe, Torishima chutou a lata de lixo uma vez, então chamou o vice-editor-chefe sob seu comando e o instruiu a fazer mangás de detetive.
O trabalho que começou não foi popular e foi cancelado após 15 capítulos. A partir de então, Torishima segue orgulhosamente o caminho em que acredita. “Será que essa nova série vai ser um sucesso?” Torishima estufou o peito quando questionado pelos executivos. “Você não saberá até tentar”.
Os verdadeiros três pilares da Jump
O que Torishima defendia era um retorno ao básico. De acordo com ele, os três pilares da Jump não são a tão dita “amizade, esforço e vitória”. “Crianças não gostam de trabalho duro. Mangá é entretenimento, não moralidade, então tudo bem, desde que seja divertido.” Na verdade, a frase mais popular de Torishima em uma pesquisa com leitores quando ele era um novato era “amizade, saúde, vitória”, e os dois caracteres de esforço não foram incluídos.
A revista de quadrinhos para meninos, Sunday, foi lançada em 1959 e teve um certo número de leitores. Inevitavelmente, a Jump se viu forçada a isso com o tempo, e tudo o que continuaram a refinar para transformar essa fraqueza em força está resumido nessas três coisas.
Torishima, que voltou ao departamento editorial da Jump pela primeira vez em três anos, parecia estar na defensiva da revista, que havia estabelecido a marca de 6,53 milhões de exemplares, por causa dos grandes números. Não há novas serializações de novos autores, apenas obras de autores de nível médio e figuras influentes que já conquistaram certa reputação. Mesmo entre os novos projetos que Torishima assumiu e esmagou, não houve uma única nova serialização de um novo autor. Torishima sentiu que por trás de seu recall estava o desejo da administração de que seu querido Akira Toriyama serializasse outro trabalho de sucesso.
Naruto e Bleach seguiram o exemplo
Não há golpes explosivos, os números estão caindo lentamente, e se escolhia uma rota estável sem poder enfrentar desafios por causa da ansiedade, e não há golpes explosivos… Foi ONE PIECE, uma “nova série de um autor novato” nascido de “um trabalho conjunto com um editor” que quebrou a espiral negativa em que a Jump havia caído após sua era de ouro.
Seguiram-se várias novas séries com forte apelo. “NARUTO”, que retrata o crescimento de um menino ninja, e “BLEACH”, em que um estudante do ensino médio com um poder especial confronta Shinigamis, passaram na reunião de serialização, com a qual ONE PIECE penou, unanimemente, e rapidamente se tornaram grandes porta-vozes. “Prince of Tennis” e “Hikaru no Go” criaram fenômenos sociais que tornaram o tênis e o Go populares entre as crianças.
Os editores que não conseguiam produzir obras de sucesso eram demitidos e um princípio de competição total se enraizou no departamento editorial. Durante os cinco anos em que atuou como editor-chefe, todas as obras, exceto a longa série “KochiKame”, foram concluídas e substituídas por uma nova série. O número de cópias que vinha caindo atingiu o fundo uma vez, com cerca de 3,5 milhões de cópias. Em junho de 2001, Torishima confiou o cargo de editor-chefe ao seu sucessor.
One Piece como de costume
Quase 20 anos se passaram desde então. O trabalho atual de destaque da Jump ainda é One Piece. A serialização de Naruto e Bleach acabou, e o próximo pilar ainda não cresceu.
“Para ser honesto, nenhuma das serializações atuais é interessante. O mangá está piorando.” Torishima, que é o presidente da Hakusensha, ainda tem a Jump na estante do escritório do presidente. Se perguntando se é o avesso do afeto, ele lançou um olhar severo para o seu antigo ninho.
Na verdade, a Jump não é a única coisa com problemas. A revista rival ultrapassou a Jump em declínio por um tempo de 1997 a 2001, mas ficou aquém dela novamente em 2002. Depois disso, o declínio só acelerou. A Sunday caiu para 15% de seu pico.
De acordo com a Japan Magazine Association, a circulação média total por edição das três revistas foi de cerca de 2,88 milhões no ano até setembro de 2018. Em comparação com cerca de 1995, quando a revista Jump sozinha tinha 6,53 milhões de cópias, diminuiu 77%.
Takenori Ichihara (44), o editor-chefe da Sunday, disse que desde “Shingeki no Kyojin”, que começou a serialização na revista Bessatsu Shonen em 2009, a razão pela qual não houve novos mega-sucessos no mangá Shonen por quase 10 anos é essa “diversificação de gostos”. “Com o desenvolvimento da Internet, não irá se tornar um grande movimento. Vai ser difícil.” Mas isso é realmente tudo o que existe?
Leitores tomados por smartphones
Tanto Torishima quanto Ichihara estão na mesma indústria de mangá. A severidade do ambiente circundante é dolorosamente sentida.
Enquanto o mercado está encolhendo devido ao declínio no número de filhos, a disseminação de smartphones está estimulando um afastamento dos mangás. As crianças estão mais interessadas em jogos e no YouTube do que em quadrinhos e, quando leem mangás, não usam revistas de quadrinhos, e sim smartphones.
Ichihara declara: “Não vou desistir do papel.” No verão de 2015, quando se tornou editor-chefe do Sunday, publicou uma declaração inusitada na revista que dizia: “A formação de novos funcionários é a nossa missão absoluta”, e imediatamente iniciou as reformas.
O Iminente LINE Mangá
Concluiu mais de 50 serializações em um ano e meio. Substituiu mais de 100 autores por recém-chegados. A decisão de iniciar a serialização, realizada após ouvir a opinião de todos na reunião, foi tomada apenas pelo editor-chefe. A maneira como ele diz: “Não é divertido ter um projeto com o qual todos concordam”, de alguma forma ressoa com Torishima, que antigamente quis publicar “uma nova série de um novo autor” e decidiu publicar One Piece, que dividia opiniões.
No entanto, a tempestade digital é imparável. Entre eles, o número de downloads de “LINE Manga”, que cresceu rapidamente para se tornar o principal aplicativo de mangá no Japão, ultrapassou 20 milhões. O número de obras originais também está aumentando, ameaçando mídias de papel como a Jump e a Sunday, que existem há mais de meio século.
Entrevista com Kazuhiko Torishima e Hiroshi Matsuyama, o presidente da CyberConnect2 (12 de outubro de 2019)
Recentemente, tive muitas oportunidades de conhecer Kazuhiko Torishima. Torishima-san foi o responsável pela edição do famoso criador de “Dragon Ball”, Akira Toriyama. Eu comecei a trabalhar com a Shonen Jump (Shueisha) por causa de NARUTO’, e isso aconteceu há cerca de 20 anos. (por volta de 2000)
Então, quando comecei a trabalhar na Shueisha, Torishima-san não estava mais na área e já havia se tornado uma pessoa importante (executivo), então mesmo tendo a oportunidade de cumprimentá-lo em eventos, não tive muitos contatos pessoais. Ele não era uma pessoa próxima com quem eu pudesse conversar.
No entanto, Torishima-san agora é membro da Hakusensha, não da Shueisha. (Ele é o representante da Hakusensha desde 2015 e é o presidente desde 2018.) Devido a algumas conexões estranhas, recentemente tive mais oportunidades de conversar (e beber) com ele. Seja em evento, um programa de rádio ou apenas numa festa com bebidas
“Não, eu estava ciente de Matsuyama-kun, mas é estranho que não tenha tido essa oportunidade até agora.” Ele agora fala sobre essas coisas com um sorriso despreocupado.
Portanto, segue a conversa que tive com Torishima-san sobre o mangá chamado “Dragon Ball'” (enquanto bebíamos).
“A história sobre Dragon Ball que ouvi de Kazuhiko Torishima”
Torishima: No início, Dragon Ball não era tão popular.
Matsuyama: Hã? Não era? Eu lia Dragon Ball na Jump naquela época, sabe. Mas eu pensei que sempre foi popular.
Torishima: Não, era diferente naquela época. Achava que era bom no início da série, mas depois ficou menos popular e achei ruim.
Matsuyama: Quando foi isso?
Torishima: Perto do final da interação com a gangue Pilaf.
Matsuyama: Eh?! Depois do: “Me dê a calcinha de uma gostosa!!”?
Torishima: Sim, depois que Shenlong foi invocado e seu desejo foi realizado, houve uma pausa na história. Eu me perguntei se o leitor pensaria: “Ah, então este processo da história apenas se repetirá”.
Matsuyama: Isso seria inútil?
Torishima: Seria inútil se você não pudesse sentir a harmonia e a emoção do ritmo, porque no mangá, o número de personagens aumentou muito.
Matsuyama: Ah, certo, naquela época o número de personagens tinha aumentado um pouco, como Bulma, Yamcha, Pual, Oolong, Mestre Kame, Chichi, Rei Cutelo e Pilaf.
Torishima: Certo, então eu fiz Goku treinar com o Mestre Kame para manter a história simples. Junto com Kuririn. Em seguida, o Torneio de Artes Marciais foi preparado como um local para testar os resultados desse treinamento. A partir daí, ficou extremamente popular.
Matsuyama: Isso mesmo! Nossa, mas é surpreendente que tenha havido algo como uma calmaria em Dragon Ball. Isso faz parte do “arranjo da história”?
Torishima: Você não tem que analisar.
Matsuyama: Mesmo assim, como você teve as ideias por trás da organização da história?
Torishima: Eu estudei Hokuto no Ken.
Matsuyama: Oh! Hokuto no Ken?! Isso é surpreendente.
Torishima: Foi porque a popularidade de Dragon Ball diminuiu, então eu não tive escolha a não ser estudá-lo. A série mais popular na época era Hokuto no Ken.
Matsuyama: Isso é verdade, né?
Torishima: Então eu pesquisei e li 3 volumes de Hokuto no Ken.
Matsuyama: O quê? Até o volume 3? Só até esse ponto?!
Torishima: Você só precisa ler um pouco de Hokuto no Ken para entendê-lo. Eu não ligava muito pra obra.
Matsuyama: Oh?! Como você pode dizer isso?!
Torishima: Nah, está tudo bem porque é apenas minha preferência pessoal. Eu não gosto dela. Mas Hokuto no Ken era tão popular na época que li com atenção e o estudei, e é assim que o futuro de Dragon Ball evoluiu. Eu decidi as políticas.
Matsuyama: Você quer dizer em termos de arranjo da história?
Torishima: Sim, tornei a história simples reduzindo a quantidade de personagens.
Matsuyama: Então foi isso!
Torishima: Quando li Hokuto no Ken, senti que era um pouco enfadonho. Mas fiquei impressionado com os diálogos: “Você já está morto”; “Não me qualifico para viver mais um dia!!”; “Porque eu amo a mesma mulher.” e “Não tenho arrependimentos na minha vida”. As crianças acham que essas falas parecem legais, é claro. Tinha muito apelo nesse sentido e era incrível.
Matsuyama: Como você planejou mudar a política de Dragon Ball?
Torishima: Foi quando decidi fazer de Dragon Ball um trabalho sem substância.
Matsuyama: Sem substância?
Torishima: Isso mesmo, Matsuyama-kun, você se lembra de ter aprendido alguma coisa lendo Dragon Ball?
Matsuyama: Bem, é claro, hum…
Torishima: Não, não há nada que você possa aprender lendo Dragon Ball. Não tem uma lição de vida, é inútil em nossas vidas; é apenas uma história em quadrinhos engraçada. E tudo bem!
Matsuyama: …(Talvez seja verdade, mas dizer dessa forma).
Torishima: Essa é outra resposta que veio do estudo e pesquisa de Hokuto no Ken, porque as crianças não querem que preguem quando lêem quadrinhos, então tivemos que torná-lo mais interessante no momento. Decidi seguir um caminho diferente em Dragon Ball, porque Hokuto no Ken era tão legal que imaginei que, já que não poderia ser útil em nossas vidas, vamos apenas torná-lo divertido. Após essa decisão, aprendi mais com Hokuto no Ken e descobri que havia um segredo nos desenhos.
Matsuyama: Um segredo nos desenhos?
Torishima: Nos mangás daquela época, quando o personagem principal acertava um inimigo, havia muitas imagens em que basicamente duas pessoas estavam no quadro, e o personagem principal estava batendo no inimigo da direita para a esquerda. Você via isso nas obras de Hiroshi Motomiya e Masami Kurumada .
Matsuyama: É verdade.
Torishima: Mas em Hokuto no Ken, um soco vai tipo: “Attata-tata!” e voa para o lado do leitor que está lendo. Isso era novidade!
Matsuyama: Com certeza!!
Torishima: Como Tetsuo Hara era um grande ilustrador de imagens estáticas, me pergunto se Buronson tinha que manter isso em mente, onde Kenshiro criaria um buraco num cara e o faria cambalear, certo? Essas imagens eram tão legais. Assim que percebi isso, mudei a direção da ação de Dragon Ball. Pense: o que Tetsuo Hara não tem que Akira Toriyama tem?
Matsuyama: O quê?
Torishima: Movimento tridimensional. Akira Toriyama tem grande consciência espacial, então ele é melhor em desenhar ações tridimensionais, e eu pensei que isso ajudaria a diferenciá-lo de Hokuto no Ken. Depois disso, deveria ter sido fácil, mas eu precisava de um lugar no desenvolvimento da história onde pudéssemos mostrar de forma maneira o fato de que Goku treinou e se tornou mais forte em um estágio tridimensional, então começamos a caminhar em direção ao… ”
Matsuyama: Torneio de Artes Marciais!!
Torishima: Sim, é por isso que a plataforma de batalha é um quadrado e existem regras para cair fora dela. Como resultado, você não só consegue voar em todas as direções, mas a ação pode aproveitar ao máximo a diferença de altura de uma forma natural, entendeu?
Matsuyama: Uau, eu só… só consigo me sentir surpreso. Pensar que foi estudado, desenvolvido e projetado com tal pensamento em mente.
Torishima: Então, veja, não há nada ali para analisar!
****
Agora que tenho uma manchete, tentei terminá-la desta vez. Através das minhas conversas com Torishima-san, extraí uma anedota ridiculamente interessante e a transformei em um artigo. Portanto, pode parecer um pouco confuso ou desorganizado, mas, por favor, me perdoem.
Se houver uma boa resposta nos comentários, ou tal solicitação, gostaria de fazer outro artigo semelhante. Por fim, quero baixar a cortina com uma fala que Torishima-san me disse no final do dia:
“Criar um mangá que ajude as pessoas não é tão importante quanto fazer um mangá que seja divertido.”
– Fim.
ITmedia Business Online (04 de dezembro de 2019)
Conversa entre Kazuhiko Torishima, Shin Unozawa, Daisuke Uchiyama e Shinichi Taira
PAINEL DE DESENVOLVIMENTO DE VIDEOGAME: UNITE TOKYO 2019
O lendário editor-chefe da Jump quebra “o ciclo vicioso que cria jogos ruins” durante o desenvolvimento de uma adaptação do jogo Dragon Ball
No dia 26 de setembro, o Unite Tokyo 2019 foi realizado no Grand Nikkō Tokyo, organizado pela gerência do Unite Tokyo 2019. Hoje, traremos a você uma de suas sessões, intitulada “Por que as editoras e as empresas de desenvolvimento de jogos não concordam? A história de como uma adaptação de um jogo de Dragon Ball se tornou uma grande dor de… quero dizer, uma grande oportunidade de aprendizado.”
Além do autor de tais duras críticas, o Sr. Torishima, vindo ao palco hoje teremos o membro do conselho de administração da Bandai Namco Entertainment, o Sr. Daisuke Uchiyama, e o conselheiro da Sede Estratégica de IP da Bandai Namco Holdings, o Sr. Shin Unozawa. Além de Dragon Ball Z, Dragon Ball Z 2 e Dragon Ball Z 3 (série de jogos Budokai no Japão), o Sr. Uchiyama é conhecido por também ter sido o produtor de grandes sucessos como as séries .hack e Narultimate Hero. Unozawa é conhecido como produtor da série animada pra TV, Mobile Police Patlabor, e também por seu mandato como CEO da Bandai Namco Games.
Moderando a discussão estará o gerente do site de jogos Den Faminico Gamer e CEO da Mare Corporation, o Sr. Shinichi Taira.
O PROBLEMA DO PRAZO QUE DÁ ORIGEM AOS JOGOS RUINS E AOS “MITOS DO PROBIDO”.
Taira: Antes de passarmos ao nosso tópico principal, acho que seria bom se pudéssemos falar sobre a longa história dos jogos de Dragon Ball. Essa tabela cronológica abrange cerca de cinco páginas, mas Dragon Ball começou sua serialização na Weekly Shōnen Jump em 1984, e a série animada começou dois anos depois, em 1986. Os jogos do Famicom começaram a ser desenvolvidos nessa época. Olhando para a tabela, fica bem claro o quão próximo era o relacionamento entre Dragon Ball e o desenvolvimento de jogos, e como quase sempre era a Bandai ou a Bandai Namco lidando com essas adaptações. Eles têm estado muito intimamente ligados. Bem, Torishima-san, por favor, conte-nos os detalhes de como Dragon Ball foi transformado em videogame.
Torishima: Na verdade, durante a segunda metade de Dr. Slump (a obra que costumava ir ao ar no horário de Dragon Ball), nosso patrocinador não era a Bandai, e sim a Epoch (localizada na cidade de Taitō, prefeitura de Tóquio). Porém, quando Dragon Ball começou, a Bandai entrou no projeto. O mangá estava indo super bem e o anime também, e como o Famicom estava passando por um boom na época, a Bandai produziu nosso primeiro jogo para o console, Dragon Ball: Shenron no Nazo. Acho que o jogo vendeu cerca de 1,5 milhão de cópias (na verdade, 1,2 milhão de cópias, de acordo com os dados da página 216 do Super History Book de 30º Aniversário, lançado em 2016). O projeto foi liderado por Shinji Hashimoto-san, que agora trabalha na Square Enix. E assim, Hashimoto-san veio e disse que também queria fazer um segundo jogo. No entanto, pouco antes de Hashimoto-san dizer isso, a agência de publicidade nos disse que a Bandai queria desistir do patrocínio do anime. Então eu recusei Hashimoto-san imediatamente. Eu disse que a Bandai não poderia desenvolvê-lo. E quando ele perguntou o porquê, eu disse “porque eles querem cancelar o patrocínio”. Quando eu disse a eles que apenas os patrocinadores têm direitos preferenciais em relação às mercadorias, ele voltou com o rosto pálido e, uma semana depois, a Bandai renovou seu patrocínio e mais tarde produziram o segundo jogo, Dragon Ball: Daimaō Fukkatsu. Havia essa história por trás de tudo isso. (risos)
Unozawa: Não há contrato envolvido. Não há contrato entre a Bandai Namco e a Shueisha estipulando “você pode fazer jogos de Dragon Ball por XX anos”. É um pouco misterioso, não? (risos)
O “CRIMINOSO DE GUERRA CLASSE A” QUE FEZ A BANDA TER UMA PERDA DE 26,8 BILHÕES DE IENES
Taira: Quando Dragon Ball estava tendo suas primeiras adaptações de jogos, coisas como quanto seriam os royalties não foram pré-determinadas, certo? E das muitas conversas que tenho ouvido, as taxas de royalties decididas por Torishima-san na época se tornaram a base da indústria até hoje. Torishima-san era muito jovem, ainda na casa dos vinte anos, mas rapidamente estabeleceu muitas coisas que não havia precedentes uma após a outra. Essas eram as circunstâncias da época. Então, Uchiyama-san, quando foi que você se envolveu com os jogos Dragon Ball?
Uchiyama: Entrei na Bandai em 1994 e fui designado para o departamento de jogos. E o primeiro jogo para o qual fui designado foi Dragon Ball Z: Super Butōden 3 para o Super Famicom, como assistente. Foi aí que comecei a me tornar uma dor de cabeça para o Departamento Editorial da Jump em Jinbōchō. Desde então, venho produzindo jogos de Dragon Ball para o público de todo o mundo, então percebo que é uma franquia com a qual tenho uma conexão profunda.
Taira: Isso pode não se limitar apenas a Dragon Ball, mas quais eram as tendências, ou a vibração geral da Bandai da época, quando eles começaram a fazer adaptações de jogos de mangás ou animes? Vou ser bem franco aqui, mas naquela época havia muitos jogos da Bandai que não eram exatamente obras-primas. Então, queria perguntar a você, Unozawa-san, se já enfrentou essa situação?
Unozawa: Fui encarregado das operações de jogos a partir de 1999, mas de 1995 a 1999 a Bandai fez parceria com a Apple para produzir essas máquinas de jogos chamadas Pippin Atmark (uma máquina multimídia desenvolvida em parceria entre a Bandai e a Apple, que era compatível com o computador Macintosh e podia rodar alguns de seus jogos), e eu era o responsável. O projeto acabou custando à Bandai 26,8 bilhões de ienes em perdas e eu fui o “Criminoso de Guerra Classe A”. A empresa mal conseguiu evitar a falência, mas teimosamente disse “e se dermos mais uma chance aos videogames?” Naquela época, o departamento de jogos da Bandai estava localizado em Nakano-Sakaue e tinha cerca de 16 gerentes.
Uchiyama: Não havia nem 20 pessoas.
Unozawa: Realmente foi tudo feito em um espaço pequeno. Portanto, às vezes até eu me envolvia na criação do jogo. Havia uma tonelada de problemas, e toda vez que eu perguntava à equipe “por que você está fazendo um jogo tão ruim?”, eles soltavam um monte de desculpas. Primeiro, quando a proposta é escrita e a data de lançamento decidida, elas são definitivas. Mas normalmente, em algum lugar ao longo do caminho, o desenvolvimento começa a ficar pra trás, certo? No entanto, o prazo é absoluto, então eles começam a cortar custos. E, obviamente, quanto mais cantos você corta, menos todos conseguem dar seu 100%, e assim, seu esforço começa a cair para cerca de 70%, o que é muito frequente. Essa é basicamente a razão pela qual existem jogos ruins. Antes, eu costumava ser um produtor de anime na Bandai Visual, então sabia uma coisa ou duas sobre como realmente fazer algo. A primeira coisa que posso fazer, como gerente, responsável por entregar as coisas no prazo, é carregar esse fardo e dizer à equipe para fazer as coisas corretamente e dar tudo de si. Além disso, existem muitas lendas, como os “mitos do proibido”. Por exemplo, naquela época, as pessoas estavam dizendo que “você não pode postar vídeos de jogos Gundam online”. Mas eu conheço muito bem o presidente do estúdio que produz Gundam, então quando fui perguntar quem originalmente disse isso, ele respondeu “Eu nunca disse isso”. Existem muitos “mitos do proibido” como esse em relação à Jump, porque a Jump é bem assustadora. Digo, claro que seria, quando você tem essa pessoa (Sr. Torishima) no comando. (risos)
O JOGO COM UM ORÇAMENTO DE VÁRIAS CENTENAS DE MILHÕES DE IENES QUE FOI REJEITADO COM UMA ÚNICA FRASE: “DESCULPE, MAS SE IMPORTARIA DE JOGAR ISSO FORA?”
Taira: Então, acho que conseguimos explicar grosseiramente os tipos de trocas que ocorrem entre editoras e desenvolvedores de jogos, então indo direto ao assunto, eu estava pensando em perguntar ao Uchiyama-san sobre os tipos de permutas que ele experimentou na época, lembrando um exemplo real que experimentou em primeira mão.
Daisuke Uchiyama conta a história sobre a época em que recebeu uma (bronca) lição valiosa de Torishima-san
A lenda do Dr. Mashirito
“Desculpe, mas se importaria de jogar isso fora?”
O incidente que aconteceu no meio do desenvolvimento do jogo Dragon Ball Z, para o PlayStation 2, lançado em 13 de fevereiro de 2003
Uchiyama: Isso foi em 2003, cerca de 16 anos atrás. Eu fui autorizado a fazer um jogo de luta chamado Dragon Ball Z para o PlayStation 2. Foi em 2003, então foi em uma época em que as séries de televisão Dragon Ball Z e Dragon Ball GT e a serialização do mangá na Jump haviam terminado. Ao fazer um produto relacionado a uma série popular, normalmente você o faria para poder vendê-lo para crianças exatamente ao mesmo tempo em que o anime está no ar. Olhando por esse ângulo, não era exatamente o momento perfeito para desenvolver Dragon Ball Z. No entanto, fui autorizado a fazer um jogo de Dragon Ball logo após entrar na empresa, e pouco antes disso, eu havia desenvolvido um jogo de Hokuto no Ken para o PlayStation (PS1), e vendeu muito bem como um produto nostálgico. Então eu pensei: “existe também muita nostalgia por Dragon Ball Z, então não venderia bem também?” Então conversei com Unozawa e começamos a desenvolver esse jogo de luta. Mas na época, pensei que as pessoas iriam gostar desde que eu fizesse algo interessante, então não expliquei as coisas corretamente para o pessoal do Departamento Editorial da Jump. Se eu visse o Daisuke Uchiyama daquela época bem na minha frente, o agarraria e lhe daria uma bronca, mas na época, eu estava extremamente despreocupado e apenas pensava “bem, isso parece legal, não é? ” No entanto, parece que houve rumores chegando ao Departamento Editorial da Jump de que “o garoto da Bandai não falou com o Departamento Editorial e está simplesmente fazendo o jogo de Dragon Ball da maneira que ele quer”. E por causa disso, eles chamaram a mim e Unozawa…
Qual foi o resultado da convocação dele…?
EM UM CAMPO DE BATALHA CERCADO POR DEZ PESSOAS
Uchiyama: No meio do Departamento Editorial, havia uma mesa, e eu sentei lá com Unozawa, mas bem na nossa frente estava Torishima-san. E em torno de Torishima-san, havia cerca de dez editores-chefe e vice-editores-chefes, todos alinhados. Parecia que todos estavam me cercando e dizendo: “você não vai sair dessa”. (risos) E assim, eles me disseram: “mostre-nos o que você tem feito”. Folheei a proposta do projeto, mas Torishima-san não a leu. Eu até trouxe algumas filmagens, mas ele nem assistiu. Ele pegou a proposta na frente dele e disse a Unozawa: “Desculpe, mas se importaria de jogar isso fora?” Ou seja: “O projeto em que todos vocês estão trabalhando agora está efetivamente suspenso”. Não importa quanto os custos de desenvolvimento aumentem, não importa quanto trabalho tenha sido investido nele, não importa quanto ele vai vender, nada disso importa. Ele nos disse: “Desde o início, esse projeto nem entendia esses personagens”. Sem nem olhar a proposta ou a filmagem que trouxemos. De qualquer forma, Torishima-san deu seu veredito enquanto os editores-chefe e os vice-editores-chefes próximos observavam. Eu pensei: “Ah, então é assim que é o famoso ‘rejeitado!’ do mangá.” Mas o verdadeiro ‘rejeitado!’ é realmente muito difícil de ouvir, não é? Isso é o que eu senti. Pude ver isso claramente.
Torishima: Bem, vou dizer que as memórias de Uchiyama-san e as minhas são um pouco diferentes, mas eu vi a filmagem. E as propostas de projetos da Bandai são completamente desprovidas de conteúdo, então não faz sentido nem olhar para elas. (risos) Assim que vi a filmagem, imediatamente pensei: “isso não é bom”. Quanto ao porquê de não ser bom, isso é fácil de explicar. Os supervisores podem dizer com apenas uma olhada se os personagens se parecem com eles ou não. As crianças são fãs do trabalho original, então se os personagens divergem disso, eles são falsos. Como membro do Departamento Editorial, simplesmente não podia aprovar falsificações. Por isso, assim que vi, pensei: “são falsos”. Esses não serviriam. Parece que o garoto da Bandai está fazendo alguma coisa estranha relacionada a Dragon Ball. A verdade é que parece que eles estão constantemente revisando este jogo Dragon Ball Z com a Toei Animation, mas eles não o revisaram com o Departamento Editorial da Jump. E assim, por fim…
“O garoto da Bandai não está falando com o Departamento Editorial. Parece que ele está fazendo alguma coisa estranha relacionada a Dragon Ball.”
Esta foi a informação que chegou aos ouvidos de Torishima-san! Houve uma convocação para o Departamento Editorial da Jump, e de Torishima-san veio apenas uma frase simples:
“Desculpe, mas se importaria de jogar isso fora?”
Este projeto não entende os personagens!
Na época, o projeto estava passando do estágio alfa para o estágio beta e 300 milhões de ienes já haviam sido gastos nele. Este foi um projeto de escala considerável, mas Torishima-san disse coisas como:
“Este projeto simplesmente não entende os personagens!”
“Não podemos vender um produto de Dragon Ball de tão baixa qualidade.”
“Não importa quanto já foi gasto, não ligamos.”
“A Bandai não poderia fazer algo assim.”
Na época, Uchiyama apenas pensou que queria morrer.
Torishima: Também está escrito no slide, mas acho que foi Unozawa-san quem disse na época que “várias centenas de milhões de ienes já foram gastos”. Então eu disse a eles a renda anual de Akira Toriyama-san. Na época, acho que era em torno de alguns bilhões de ienes. Então eu disse: “Você acha que eu posso ir até aquela pessoa com um projeto no valor de algumas centenas de milhões de ienes e dizer: ‘por favor, vamos vender um produto falso!'” Acho que é por isso que eu disse: “Desculpe, mas por favor apenas jogue isso fora.”
Unozawa: Eu me lembro também. Eu também disse: “Você nos deixou fazer um jogo de One Piece, e vendeu muito bem”. E Torishima-san apenas respondeu: “Ah, é bom que estejamos lucrando com One Piece. Você poderia, por favor, jogar isso fora?” (risos)
Uchiyama: Para um produtor humilde como eu, isso foi muito ruim. Havia dezenas de pessoas na equipe de desenvolvimento e perguntas como “o que a Bandai vai fazer sobre os custos de desenvolvimento que já incorremos?” também foram levantadas. Mas já que o projeto foi rejeitado, não tivemos escolha a não ser mudar de rumo, mudar o projeto como fomos instruídos e dar tudo de nós. Tanto eu quanto Unozawa. Então pedimos que nos dessem uma segunda chance, e eles nos disseram: “se você conseguir trazer alguma coisa, então traga algo que será impossível para a gente não olhar”. Acho que a próxima vez que trouxemos algo para eles foi cerca de três meses depois. Torishima-san nunca nos deu uma explicação detalhada sobre por que os personagens eram ruins ou por que não era um bom projeto de Dragon Ball. Ele apenas disse “desculpe, mas você poderia, por favor, jogar isso fora?” Então, a partir daí, pensamos desesperadamente sobre o que nos disseram e conversamos longamente com a equipe de desenvolvimento. Obviamente, a data de lançamento foi adiada, o orçamento aumentou e houve uma tempestade de desculpas à equipe de desenvolvimento. Mas não havia como parar agora, então nos perguntamos como deveríamos seguir em frente, e sim, foi bem difícil. Unozawa me pressionou tanto que me senti como um daqueles panos de casa molhados que foram torcidos tanto, que não saía mais uma única gota de água. (risos) Foi realmente difícil naquela época.
Nota: O verbo 絞る (shiboru) tem um significado literal de “torcer”, mas um uso mais coloquial de “repreender”. Uchiyama está brincando com os dois significados aqui.
Torishima: Acabei de lembrar que a Bandai realmente pensou e disse: “Hokuto no Ken vendeu bem por causa de seus personagens nostálgicos, então na próxima vamos fazer Dragon Ball”. Isso realmente mostra como eles são incompetentes. (Sala de conferências cai na gargalhada) De qualquer forma, na época, Dragon Ball não estava sendo exibido na TV e a serialização do mangá também havia terminado, o que significa que, como eles eram “personagens finalizados”, a Bandai apenas pensou “faremos o trabalho para você”. “Contanto que nós apenas façamos isso, ele vai vender, certo?” Essa era a mentalidade deles quando trouxeram o projeto para nós. E por causa disso, de apenas uma olhada no que eles nos mostraram durante essa reunião, pude ver que eles não fizeram nenhum dever de casa, como ler o trabalho original ou descobrir como construir os personagens. Sem falar que não conversar com o departamento editorial da Jump, a editora do trabalho original, é algo que você não pode fazer pra começo de conversa. Se você não obtiver aprovação do departamento editorial, é o mesmo que tentar vender algo sem a contribuição do autor original. Vou apenas dizer sem rodeios, para nós do departamento editorial, fazer isso é o mesmo que lançar algo falsificado. Porque se nos perguntarem “por favor, deixe-nos lançar algo pirata”, de maneira alguma iremos aprová-lo.
Uchiyama: Hmm, essa coisa toda de “falsificação” irá surgir mais tarde na conversa. (risos)
“Mashirito” não se contentava com sentimentos como “Desde que o façamos, vai vender, certo?”
A BANDAI PODE SER QUEM VENDE O PRODUTO REAL, MAS SERÁ O DEPARTAMENTO EDITORIAL DA JUMP QUEM RECEBERÁ TODAS AS RECLAMAÇÕES DAS CRIANÇAS
Unozawa: Simplificando, o jogo Hokuto no Ken foi feito para o primeiro PlayStation. Assim, conseguimos manter os custos baixos. Mas Dragon Ball Z foi feito para o PS2. Quando você faz jogos para o PS2, os custos de desenvolvimento de repente ficam muito grandes, então 500 milhões de ienes não serão suficientes. Mas na Bandai, um custo de desenvolvimento de 500 milhões de ienes era algo inédito. Não conseguiríamos lucrar apenas com as vendas domésticas. Então começamos a pensar em que tipo de série também venderia bem no exterior e percebemos que Dragon Ball também era popular lá fora. Foi ao ar em países como a França. Então, quando percebemos isso, começamos a pensar em fazer um jogo de Dragon Ball. Assim, escolhemos a Dimps (localizada em Toyonaka, prefeitura de Osaka) como desenvolvedora. Eles tinham pessoas que trabalhavam em Street Fighter para Capcom e Fatal Fury para SNK, então eles já eram muito bons com jogos de luta. Tínhamos confiança de que, se realmente pedíssemos a uma empresa como essa, um bom jogo poderia sair. Mas quando a Bandai se torna patrocinadora de um anime, pagamos apenas uma agência de publicidade. Feito isso, no caso de Dragon Ball, a Toei Animation é o ponto de contato, então o departamento de licenciamento da Toei Animation é o responsável por supervisionar o projeto. Mas em um jogo, os personagens se movem e falam como no anime, não é? Então, considerando isso, ter que fazer com que eles examinem tudo é um trabalho muito difícil, não é? Mas ainda assim, o que tínhamos que fazer, e fizemos tudo de acordo a partir daí, era que, toda vez que conversávamos sobre algo com a Toei Animation, também conversávamos sobre isso com o departamento editorial da Jump. E não havia outra maneira de fazer isso a não ser explicar as coisas da mesma maneira para os dois e fazer com que ambos aprovassem. Então, sendo muito exigentes com todo o processo, conseguimos manter a licença para vender o jogo.
Uchiyama: E é por isso que, como diz o slide que está sendo exibido agora, conduzimos nossas conversas sobre o jogo com muita seriedade. Quando surgiram problemas como “os personagens não se parecem com eles mesmos”, obviamente, fomos aos modelos 3D para ver qual era o problema, mas também focamos muito em questões como se as animações ou as silhuetas combinavam com seus respectivos personagens com a equipe de desenvolvimento.
Tudo sobre o jogo teve que ser revisado!
Como resultado de reuniões muito intensas:
– Foi decidido corrigir todos os aspectos dos modelos 3D e suas animações, que são a vida e alma dos personagens.
– Se Torishima-san não der luz verde, eles não poderão continuar com o desenvolvimento.
– Tudo isso, obviamente, sem data de lançamento concreta.
Isso foi no início de 2002. A data de lançamento prevista foi planejada para o verão de 2002.
Uchiyama: Obviamente, isso também se tornou um grande problema para a equipe de Bandai… Houve reuniões de emergência no meio da noite com a Dimps, que estava desenvolvendo o jogo… Correções precisavam ser feitas em todos os aspectos do desenvolvimento do jogo… E cerca de três meses depois, todos os recursos tiveram que ser direcionados para os modelos 3D e animações. Refizemos os modelos quase do zero. E não verificamos apenas o rosto, nos certificamos de que todo o personagem parecia ele mesmo. Tendo feito isso, mais uma vez trouxemos imagens de algumas cenas para Torishima-san. Eu pensei que ele ia dizer coisas como “isso não está bom” e “isso também não está bom”, então eu trouxe a filmagem com minhas expectativas claramente sob controle, mas na realidade, assim que ele viu, disse “oh, está muito melhor” e “é disso que eu estava falando” e deu sua aprovação imediatamente. O que eu pensava naquela época era que, se tivemos a aprovação tão rápido, não foi apenas porque os modelos de CG combinavam ou não com os personagens. Para chegar até aqui, nós e a equipe de desenvolvimento enfrentamos com seriedade o trabalho conhecido como Dragon Ball, enfrentamos Goku e Vegeta, e conseguimos fazer algo que estava realmente vivo. Eu me pergunto se Torishima-san também viu a seriedade e a determinação que colocamos no produto que mostramos a ele. Dezesseis anos atrás, era o que eu pensava, mas hoje é a primeira vez que me pergunto se esse foi realmente o caso. (risos)
Pensando consigo mesmo “isso será suficiente?”, eles voltaram para Torishima-san. E quando o fizeram…
“Ah, isso está muito melhor.”
“É disso que eu estava falando.”
“OK, você pode continuar.”
A reunião terminou em aproximadamente 15 minutos.
Dar uma rápida aprovação caso esteja tudo bem é o “Estilo Mashirito”
O EDITOR REPRESENTA O AUTOR ORIGINAL
Torishima: Como Uchiyama-san disse, foi realmente um trabalho árduo fazer apenas um jogo. Também foi um trabalho árduo fazer Dragon Ball, onde, desde o momento em que a serialização começou até construirmos o personagem do protagonista Son Goku no Torneio de Artes Marciais, ele ficou baixo nas pesquisas de popularidade; e quando se tratava da série animada, também não havia ninguém na empresa para dar conselhos, então até chegar a esse ponto, tive que travar muitas batalhas solitárias. De qualquer forma, só porque a serialização do mangá original e o anime terminaram, se lançássemos algo pela metade (como tínhamos até aquele momento), destruiríamos a marca. Para as crianças, Dragon Ball sempre será a história de seu amado Goku, certo? Portanto, não seria correto lançar algo que se desvie disso. Sua imagem interna seria destruída de uma só vez. Mesmo se a Bandai fosse quem vendesse o produto real, seria o departamento editorial da Jump que receberia todas as reclamações. Nós recebíamos ligações de crianças mesmo depois das 15h, dizendo coisas como “os personagens deste jogo não se parecem com os de Dragon Ball”. É por isso que nós editores realmente devemos fazer as coisas bem. Não apenas representamos o autor original, mas também temos a palavra final. Mas, por outro lado, como a Bandai foi a patrocinadora das adaptações de anime não apenas de Dragon Ball, mas também de várias outras propriedades da Jump, também tivemos que ter um bom relacionamento de trabalho com eles. A verdade é que isso é algo que eu não contei ao Uchiyama-san, mas o plano de lançá-lo em agosto acabou sendo rejeitado, então o próximo período que a Bandai mencionaria seria a extremamente competitiva temporada de férias em novembro e dezembro. Não havia como dizer a eles para não lançá-lo naquela época, então não havia nada a fazer além de aprovar o novo cronograma. Por isso, pensei que estaríamos em apuros se a Bandai mais uma vez nos trouxesse algo que não estivesse à altura. Além disso, como a Shueisha lançaria o Kanzenban de Dragon Ball em dezembro, já havia várias campanhas em andamento. Então, se a Bandai lançasse o jogo em dezembro, a Shueisha poderia, de certa forma, dar uma mãozinha. Então nós aprovamos.
A suspensão completa do trabalho em Dragon Ball: 1
Taira: Isso aconteceu quando um produtor, um júnior meu, estava produzindo um título de Dragon Ball e um produto do Departamento de Cards da Bandai – Data Carddass: Dragon Ball. O desenvolvimento de produtos Dragon Ball estava aumentando e havia muitos novos gerentes chegando, então era uma época em que a seriedade com que Dragon Ball era tratado estava ficando cada vez mais fraca… Problemas como baixa qualidade e discussões sem sentido estavam se acumulando, então foi lentamente se tornando um problema que não podia mais ser evitado…
Torishima: No início, o jogo de cartas Dragon Ball da Bandai, Data Carddass, estava vendendo muito bem, mas quando os cards Yu-Gi-Oh da Konami surgiram, os cards Dragon Ball pararam de vender. O motivo era simples: essa era a especialidade da Bandai e eles eram muito bons em entregar algo com um grande alcance, mas falhavam quando se tratava de profundidade. Eles começaram a correr, mas não tinham resistência para terminá-la. As cartas eram fáceis de entender, mas não havia estratégia por trás delas. Então, mencionei o exemplo de Yu-Gi-Oh os disse: “Quero que você planeje o jogo de cartas corretamente”, mas eles não levaram a sério. Então não tive escolha a não ser trazer as grandes armas. Eu suspendi temporariamente todo o trabalho e não deixei que eles lançassem um único produto. Eu disse para eles pensarem em algumas contrapropostas e depois virem ao meu encontro. Dito isto, deixei-lhes uma dica. A Bandai começou lançando algo que conectava cards e gabinetes de arcade. Na época, a Bandai Namco tinha acabado de ser formada, então os disse que eles claramente tinham a tecnologia. Eles também deveriam ter os designers que criaram as regras do jogo de cartas, então os disse “criem um jogo de cartas de Dragon Ball adequado como um grupo”. Eu não ia permitir mais desculpas incompletas, e é por isso que eu parei com as coisas.
Desenvolvimento de produtos, recebimento de pedidos, criação de anúncios, realização de eventos, etc. – as etapas de desenvolvimento de um determinado produto são todas diferentes, mas quando todo o trabalho é ordenado a parar sob esse tipo de supervisão, isso significa que as várias empresas de um determinado grupo não podem se mover adiante com qualquer coisa.
E, obviamente, os gerentes e divisões no centro da situação foram colocados em uma situação muito difícil
Dizer que este é um problema para qualquer um envolvido seria um eufemismo.
Mas, como resultado, todos os gerentes de Dragon Ball de todos os grupos se reuniram e discutiram desesperadamente como lidar com a franquia, com que curso de ação eles responderiam quando voltassem a Torishima-san para resolver esse problema e como eles deveriam transmitir sua seriedade.
No final, acho que decidir corrigir a atitude que os fez lidar com a Propriedade Intelectual de Dragon Ball descuidadamente foi uma pílula muito amarga para engolir.
Uchiyama: Então, o que você acha? Foi muito ruim, né? (risos) Mas ouvindo sobre isso agora, foi completamente razoável. E, na realidade, na próxima vez em que trouxemos algo, conseguimos avançar, não é?
Torishima: A pessoa responsável na época era uma alguém chamado Furusawa-kun (Sr. Keisuke Furusawa) e o que realmente me impressionou foi como suas sugestões de melhorias foram bem pensadas. Ele disse que quando você traz novos cards, é impossível responder imediatamente, e mesmo se você usar a tecnologia da Bandai Namco, ainda levará algum tempo. Mas então, ele contrariava isso dizendo: “Enquanto isso, deixe-me lidar com isso assim”. Suas sugestões foram realmente interessantes. Na época, Dragon Ball não estava sendo exibido na TV, então era difícil vender os produtos. Então, Furusawa-kun trouxe esta sugestão: o anime Dragon Ball estava sempre à beira de alcançar a serialização, portanto, esticou com força o que eram apenas algumas páginas de conteúdo, e por causa disso o ritmo foi bem ruim. Então ele disse: “Nesse caso, por que não cortamos todas as partes filler e fazemos um anime mais fiel? Poderíamos apenas remasterizá-lo e transmiti-lo na TV.” Quando isso foi sugerido a um produtor da Toei Animation chamado Kōzō Morishita (atualmente presidente do conselho da Toei), ele respondeu: “Isso é interessante”. E foi isso que levou a Dragon Ball Kai. Então, por causa disso, conseguimos que as crianças assistissem ao anime Dragon Ball mais uma vez. E depois de um tempo, o jogo de cartas Dragon Ball foi relançado, desta vez com planejamento adequado e com uma estratégia coordenada entre todos os grupos, e as cartas voltaram a ser vendidas. Foi assim que as coisas aconteceram.
120 BILHÕES DE IENES EM VEDAS DE MERCADORIAS RELACIONADAS A DRAGON BALL
Unozawa: Eis que tivemos Torishima-san dizendo: “Vamos fazer Dragon Ball mais uma vez”. A razão é que o anime One Piece estava em seu décimo ano e as coisas estavam começando a perder um pouco de força. Para ser perfeitamente honesto, estávamos apenas lançando os jogos por pura força do hábito. Então, Torishima-san me disse: “Já que o anime One Piece está chegando ao seu décimo aniversário, faça um bom jogo de One Piece, Shin Unozawa-kun, e realmente coloque seu coração nele. Em troca, também vou fazer o mangá e o anime ganharem força. E assim, o filme de animação One Piece Film: Strong World, para o qual o autor original Eiichirō Oda-sensei escreveu pessoalmente a história, foi produzido, e foi a razão pela qual a empolgação com a franquia aumentou de repente. Da mesma forma, Dragon Ball também estava no momento perfeito para fazermos algo. Não havia anime de Dragon Ball, então eu realmente queria fazer alguma coisa. Mas mesmo que transmitíssemos o anime antigo, a proporção era de 4:3. Se o convertermos para alta definição e depois cortarmos todas as cenas originais que não estavam no mangá e tinham um ritmo muito ruim, poderia ser considerado uma maneira violenta de fazer as coisas, mas esse foi um dos gatilhos que levou ao renascimento de Dragon Ball. Depois disso, Torishima-san conversou com Akira Toriyama-sensei e conseguiu fazer um novo filme de animação para os cinemas.
Nota: Sabemos através de entrevistas adicionais com Torishima, por meio de Kazé na França (para o lançamento home video de Dragon Ball Kai), que Akira Toriyama recusou trabalhar em uma nova série nessa época. Em vez disso, o especial da Jump Super Anime Tour de 2008 – “Ei! O Retorno de Son Goku e seus amigos!!” – acabou sendo produzido, levando a um acúmulo gradual de produções adicionais, resultando em Dragon Ball Z: A Batalha dos Deuses dando início a um novo ressurgimento.
Unozawa: A verdade é que, no ano passado (2018), Dragon Ball foi a franquia mais vendida do grupo Bandai Namco, com cerca de 120 bilhões de ienes em vendas. Isso é ainda maior do que Mobile Suit Gundam, sabe? A razão pela qual chegou a esse ponto, como eu disse antes, foi por causa do senso de responsabilidade de Torishima-san. Quero dizer, na época, Torishima-san era o diretor administrativo sênior da Shueisha. O diretor administrativo sênior verifica tudo, desde cada projeto individual até o design de figures. Às vezes me pergunto por que é que ele está supervisionando, mas ter Torishima-san possuindo autoridade absoluta na verdade fez as coisas progredirem mais facilmente, entende?
Torishima: Hmm… em relação ao novo anime de Dragon Ball, eu realmente não tinha intenção de fazê-lo. Era o Morishita-san da Toei Animation, aquele de quem falei antes. No momento, ele é presidente do conselho da Toei, mas ele realmente me ajudou bastante na reformulação do anime Dragon Ball, então sou muito grato a ele. Naquela época, Morishita-san ficou muito doente e foi internado no hospital. Para ser honesto, eu não achava que ele ia melhorar e ser dispensado. (risos) Um dia antes de ele ser admitido, um Morishita-san muito doente veio até mim e me perguntou: “Torishima-san, se por acaso eu conseguir melhorar, você concorda em cooperar em fazer um novo anime de Dragon Ball?” Como não achava que ele ia voltar, eu disse “ok”. (risos) Foi uma recuperação milagrosa, então disse a mim mesmo que agora não tinha escolha.
ENTÃO, COMO QUER FAZER ISSO?
Taira: Em seguida, íamos falar sobre a tal da “falsificação” que surgiu na conversa anterior.
Uchiyama: Foi a mesma coisa que aconteceu comigo naquela época. Torishima-san disse a ele: “Você sabe como chamamos as coisas que você está fazendo? Já que não parece que você faz ideia, vou te dizer. Chamamos o que você está fazendo de ‘falsificação’”. A pessoa para quem ele disse isso de repente começou a levar as coisas muito a sério depois disso. (risos)
Você sabe do que chamamos títulos que não foram devidamente revisados pelo departamento editorial e que o Toriyama-sensei não tem conhecimento? Já que parece que não sabe, vou lhe dizer. Chamamos o que você está fazendo de ‘falsificação'”.
Depois disso, assim como no caso Uchiyama, ele começou a levar as coisas muito a sério.
Leitura acelerada da proposta
Uma apresentação para Torishima-san é um grande evento. Trazendo documentação suficiente para transmitir o seu ponto de vista, você faz sua apresentação criando uma história e seguindo estritamente o que está escrito nas folhas.
Mas cerca de trinta segundos após a explicação, Torishima-san disse:
“Você demora muito para explicar, então eu já li tudo.”
“Então, o que quer fazer?”
Ele leu rapidamente até o final. De repente, não havia programa, nem história. Trinta segundos de apresentação e ele já queria chegar ao cerne da questão… o que não é uma coisa fácil de fazer.
Uchiyama: Queremos seguir a proposta do jeito certo, do começo ao fim. No entanto, no momento em que eu disse “Vou começar com o esboço”, Torishima-san começou a folhear as páginas aleatoriamente e depois me disse: “Você demora muito para explicar, então eu já li tudo. Então, o que quer fazer?” Nesse ponto, eu já tinha uma história preparada, e depois disso, eu seguia em frente e explicava o que queria fazer. Ser perguntado: “o que você quer fazer?” e ter que pular tudo isso é muito complicado. Graças a isso, tornei-me mais disciplinado.
Torishima: É simples. No trabalho, as pessoas estão sempre dizendo que sou “rigoroso”, mas as crianças que compram nossos produtos são ainda mais rigorosas. Eu sei como é pagar por esse tipo de conteúdo, pagar por esses tipos de produtos com uma mísera moeda de 100 ienes da minha mesada, então não posso pensar como um adulto e dar minha aprovação a qualquer coisa antiga. Eu sempre respondo com o ponto de vista de uma criança e em seu nome. Por favor, não pense que sou eu quem está falando, pense que estou apenas transmitindo o que as milhões de crianças que estou representando me permitiram dizer. É assim que tenho pensado todo esse tempo.
AO TRANSFORMAR UM QUADRINHO EM VIDEOGAME, QUAIS SÃO AS COISAS CONCRETAS EM QUE VOCÊ DÁ ATENÇÃO?
Torishima: Assim como Uchiyama-san disse no palco durante a sessão, nós do Departamento Editorial focamos nos personagens. Isso é algo que não se aplica apenas a jogos, mas também a séries animadas: se você não conseguir traduzir os personagens corretamente, o resultado final será falso. Isso é algo que nós realmente não queremos que eles façam errado. Por outro lado, quando a série animada está começando, uma coisa que eles fazem é ter os personagens e o mundo meticulosamente examinados pelo autor original (já que é importante que corresponda ao quadrinho original). Enquanto não houver desvios, mesmo que haja pequenas diferenças, será uma adaptação fiel. É por isso que damos especial importância a isso.
QUAIS ELEMENTO VOCÊ ESPERA QUE UM GAME ADICIONE?
Torishima: Ao contrário de outras mercadorias, os jogos têm uma história, certo? Você pode reviver a história do quadrinho original. Sem mencionar que você pode controlar os personagens. Esta é uma peculiaridade incrivelmente importante. Com a série animada, enquanto você pode assisti-la, não pode experimentá-la por si mesmo. O verdadeiro prazer dos jogos é poder se transformar em Goku (o protagonista de Dragon Ball) e lutar contra inimigos, sendo algo grandioso. Durante a conferência, você mencionou a história de como eu aprovei o jogo One Piece com os personagens super deformados, mas antes mesmo disso, a Bandai pegou o Mobile Suit Gundam e fez o SD (Super Deformed) Gundam, certo? Naquela época, eu perguntei; “por que você fez este SD Gundam?” e vi como ficou. Mesmo com cabeças com o dobro do tamanho de seus corpos, o mundo ao seu redor não mudou nada e você conseguiu reintroduzir os personagens de uma nova maneira que os tornasse fáceis de gostar. Quando vi, me senti à vontade para aprovar a ideia.
É A RAZÃO PELA QUAL TEMOS O EDITOR, E NÃO O AUTOR ORIGINAL, SUPERVISIONANDO PRODUTOS COMO JOGOS ,PARA EVITAR CONFUSÃO, JÁ QUE O EDITOR É QUEM LIDA E CONSOLIDA TUDO, COMO VOCÊ DISSE NO PALCO?
Torishima: Isso, e porque se você mostrar ao autor original, eles vão querer corrigir as coisas eles mesmos. Se isso acontecesse, seria ainda mais problemático. Porque eles têm liberdade para mudar cada pequena coisa sobre o jogo
ENTÃO É POR ISSO QUE O EDITOR SUPERVISIONA PARA ELES, MAS QUAIS SÃO AS VANTAGENS DISSO?
Torishima: Eu também disse isso antes, mas você realmente tem que olhar do ponto de vista de uma criança. É por isso que tomar decisões com base apenas nas primeiras impressões é importante.
COMO VOCÊS TODOS APRENDERAM A TER ESSA MENTALIADDE INFANTIL?
Torishima: Cultivo-a todos os dias no trabalho. Elas (as crianças) vêm em viagens de campo e eu também tenho relatórios frequentes sobre suas preferências, então eu mudo minha abordagem com base no que eu deduzo disso.
Unozawa: Eu avalio suas reações nos eventos. Esse é o nosso público-alvo real e as reações deles são 100% genuínas, então você pode realmente sentir com o que eles estão empolgados.
Torishima: Você realmente pode.
TORISHIMA-SAN, ANTES, EM OUTRA ENTREVISTA, VOCÊ DISSE: “EU NÃO TENHO TALENTO PARA FAZER ISSO SOZINHO, ENTÃO PENSEI EM ME TORNAR UM EDITOR”, MAS E OS OUTROS… É POR ISSO TAMBÉM QUE VOCÊS SE TORNARAM PRODUTORES OU EDITORES, E NÃO CRIADORES?
Unozawa: Também há muito em ser um produtor. Tanto eu quanto Uchiyama somos produtores do lado editorial. Se você escreve em katakana, o trabalho é chamado de “produtor” (プロデューサー), mas se você escreve em kanji, é chamado de “empresário astuto” (商売人).
Torishima: Na verdade, os editores têm três funções: gerente, diretor e produtor. Somos gerentes porque fazemos coisas como encontrar um quarto para os novos autores de mangá alugarem e gerenciar seus prazos e outras coisas. Somos diretores porque julgamos se o trabalho que estamos olhando é interessante ou não e pensamos em como melhorá-lo. E somos produtores porque tentamos imaginar que forma o autor tomará daqui a três ou cinco anos. O resto é descobrir o talento certo para combiná-los, para que o autor não perca uma gota de seu próprio talento. Você tem que pensar em muitas coisas. Então é por isso que somos produtores. Se você misturar esses três trabalhos, terá um editor. Acho que ser produtor é uma questão de ter uma perspectiva de longo prazo.
Uchiyama: Pessoalmente, a verdade é que eu queria ser um criador. Eu até fui para uma escola técnica de design de jogos. E como havia ofertas de emprego para a Bandai postadas nos muros da escola, me inscrevi e fui aceito, mas quando cheguei lá, não havia desenvolvimento real de jogos acontecendo na própria empresa. (risos) Os únicos trabalhos dentro da empresa eram para produtores, o próprio desenvolvimento do jogo era terceirizado.
Taira: Isto é particularmente verdadeiro para Torishima-san, mas acho que há um pequeno criador escondido dentro de cada produtor de sucesso. Unozawa-san também esteve envolvido nos estágios de planejamento de séries como Mobile Police Patlabor quando trabalhou como produtor de anime, e Uchiyama-san fez o mesmo com séries como .hack, certo?
Torishima: Tudo depende se você é capaz de pensar instantaneamente “isso é interessante, não é?” ou “Acho que isso pode funcionar”.
COMO EXATAMENTE ALGUÉM PODE GANHAR ESSE NÍVEL DE INTUIÇÃO?
Torishima: Você apenas tem que olhar para um monte de coisas diferentes todos os dias.
Taira: No caso de Unozawa-san, é porque ele conversa regularmente com pessoas como Mamoru Oshii-san (famoso pelo filme Ghost in the Shell) antes de analisar propostas.
Unozawa: Reunimos os melhores jogadores em seus respectivos campos e conversamos sobre muitas coisas diferentes.
Torishima: É realmente uma grande reunião, não é?
Unozawa: Deve ser por isso que posso calcular rapidamente se algo pode ter sucesso ou não com apenas minha primeira impressão.
Torishima: Depois disso, e acho que isso também se aplica a Unozawa-san, quando você ouve o tom e acha interessante, você sente vontade de dar ao projeto dessa pessoa todo o apoio possível e lançá-lo ao mundo.
Unozawa: Você sente vontade de dizer “Fui eu que os descobri”. (risos) Porque você quer que eles digam “Torishima-san me ajudou muito naquela época”.
Fundamentalmente, as pessoas são criaturas que só querem ser elogiadas, certo? Porque eles precisam da aprovação dos outros. Se jogos, mangá, anime e música não existissem, você não necessariamente morreria. Mas você faz essas coisas porque quer levar as pessoas às lágrimas ou para que elas lhe digam que foram realmente tocadas.